quarta-feira, 3 de agosto de 2011

A PRIMAVERA DO TERROR EM MADRI

Regina Araujo
Os atentados que atingiram alvos americanos em 11 de setembro de 2001 fizeram soar os tambores do revanchismo e da guerra. Começava ali a história sangrenta das invasões do Afeganistão e do Iraque.
Os atentados que atingiram a capital espanhola em 11 de março de 2004 desencadearam uma reação a favor da paz e da convivência pacífica entre os povos. Nas ruas e nas urnas, Madri respondeu à violência desmesurada com maturidade e espírito cívico.
Visitei Madri quase um mês após os atentados.
A paz era a palavra de ordem que ressoava dos inúmeros memoriais improvisados na imponente estação ferroviária de Atocha, no centro da cidade, onde se concentraram as explosões e o maior número de vítimas fatais. A exaltação à paz e a condenação sem ressalvas ao terror e aos terroristas – assassinos, conforme estampava a maioria dos cartazes – eram expressas nas mais diversas línguas e se misturavam com uma enorme quantidade de velas e flores que homenageavam os mortos.
As lembranças da tragédia se espalhavam por toda a cidade. Nas fachadas da maior parte dos edifícios do centro histórico e nas vitrines das lojas, laços negros sobre a bandeira da Espanha expressam o luto e a dor dos moradores e comerciantes. Cidadãos a caminho do trabalho ou na famosa peregrinação noturna pelos incontáveis botecos e restaurantes, diversão tipicamente madrileña, portavam o mesmo laço preto em suas roupas. Nos circuitos mais intelectualizados, tais como a tradicional feira de livros que acontece aos domingos entre a Atocha e o Parque no Retiro, fragmentos do Guernica, obra prima do pintor Pablo Picasso evocando os horrores da guerra civil espanhola, ilustram os cartazes de repúdio tanto ao terror quanto à guerra.
Para nós, vindos do Novo Mundo, as capitais européias fascinam sobretudo pelas diversas camadas de significados históricos, incorporados na paisagem e nos monumentos arquitetônicos. No caso de Madri, as reminiscências medievais se entrelaçam com as lembranças da grandiosidade imperial do tempo dos Habsburgo e dos Bourbon, e história se revela aos poucos, em cada esquina e em cada perspectiva.
A barbárie do 11 de março já se incorporou a essa riqueza histórica. Na sede do governo regional, situada na fervilhante Puerta Del Sol, onde se encontram e se cruzam boa parte das rotas que atravessam a cidade, uma placa de mármore exalta o “comportamento exemplar” dos que prestaram auxílio às vítimas e dos cidadãos anônimos que os ajudaram. Aqui, a intenção é perenizar o espírito “Madrid agradecido”, que também predomina nas placas de metal afixadas pelas autoridades ferroviárias nas estações de trem diretamente atingidas pelas explosões.
O medo é um resultado quase inevitável do terror.
Como não poderia deixar de ser, as autoridades madrilenhas reagiram aos atentados redobrando a vigilância nos locais públicos – principalmente estações ferroviárias e metroviárias – e nos sistemas de abastecimento, já que chegaram a circular boatos de planos de contaminação criminosa das águas que servem à cidade.
Mas também neste quesito, a reação espanhola passou longe da histeria coletiva que tomou conta dos Estados Unidos como conseqüência do Também em Barcelona, onde estive durante os feriados da Semana Santa, os votos de paz estavam presentes nas fachadas, em especial nas ruelas do bairro gótico. Nesse caso, porém, a bandeira é a da Catalunha, trazendo em seu centro a palavra “paz” grafada em catalão. Assim, a expressão da solidariedade é, ao mesmo tempo, a expressão da diferença .
Apesar dos atentados, Madri e Barcelona conservaram suas condições de destinos turísticos privilegiados, como acontece tradicionalmente durante a Semana Santa. A esmagadora maioria dos visitantes, que como sempre chegava de outros países da União Européia 11 de setembro.
O trabalho eficiente da polícia especializada, que culminou com o cerco e o suicídio dos prováveis líderes do 11 de março nas cercanias de Madri, não se imiscuía no cotidiano da cidade e muito menos restringia os direitos dos cidadãos, independente de suas origens e credos. Nada de prisões indiscriminadas ou intimidação contra imigrantes.
Também em Barcelona, onde estive durante os feriados da Semana Santa, os votos de paz estavam presentes nas fachadas, em especial nas ruelas do bairro gótico. Nesse caso, porém, a bandeira é a da Catalunha, trazendo em seu centro a palavra “paz” grafada em catalão. Assim, a expressão da solidariedade é, ao mesmo tempo, a expressão da diferença .
Apesar dos atentados, Madri e Barcelona conservaram suas condições de destinos turísticos privilegiados, como acontece tradicionalmente durante a Semana Santa. A esmagadora maioria dos visitantes, que como sempre chegava de outros países da União Européia em especial Alemanha, Inglaterra, França e Portugal, desta vez estava visivelmente interessada nas discussões  políticas locais e na cobertura das repercussões dos atentados. O grito de paz que ecoava nas principais cidades espanholas certamente irá ressoar em outras capitais européias, independente do alinhamento de alguns de seus líderes aos artífices da guerra.
Boletim Mundo Ano 12 n° 3

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