quarta-feira, 3 de agosto de 2011

ONU E UNIÃO EUROPÉIA FRACASSAM EM CHIPRE

O novo alargamento da União Européia (UE), com a adesão de uma dezena de países, integrou quase todo o continente, do Atlântico às fronteiras ocidentais da CEI. Entre os novos membros, dois são micro-Estados insulares: Malta e Chipre.
Eles compartilham, curiosamente, a condição de ilhas estrategicamente localizadas no Mediterrâneo e o passado de colônias britânicas que só alcançaram a independência na década de 60.
No caminho da integração à UE, o caso mais complicado é o de Chipre. Com superfície de 9.250 km2 (menos da metade da área do estado de Sergipe), o país localiza-se a menos de 80 quilômetros da Turquia e nas proximidades da Síria e do Líbano. A imagem adequada é a de um “porta-aviões permanentemente ancorado no Mediterrâneo oriental”.
Língua, cultura e religião aproximam Chipre da Grécia. Contudo, entre 1570 e 1878, a ilha permaneceu sob o controle do Império Turco-Otomano. As influências grega e turca revelam-se na composição da população: os cipriotas de origem grega e religião ortodoxa correspondem a cerca de 78% da população; os de origem turca e religião muçulmana perfazem cerca de 18%.
A decadência otomana fez Chipre deslizar para a influência britânica. Em 1878, a Grã- Bretanha adquiriu controle parcial sobre a ilha. Os acordos de paz firmados após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) transformaram- na em colônia britânica.
Grécia e Turquia, países que têm grande interesse nos destinos de Chipre, possuem rivalidades ancestrais mas são parceiros na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Desde o século XIX, greco-cipriotas elaboraram planos para unir Chipre à Grécia, um projeto conhecido como enosis.
Isso sempre foi considerado inaceitável pela Turquia. Com base no ideário da enosis surgiu, em 1946, a Organização Nacional dos Combatentes Cipriotas (EOKA), que dirigiu sua luta contra o domínio colonial britânico.
Os acordos que resultaram na independência de Chipre, em 1960, foram marcados por acirradas discussões em torno partilha do poder no país entre as duas comunidades. Os turcos-cipriotas queriam representação política eqüitativa à dos greco-cipriotas, enquanto estes defendiam participação proporcional ao peso demográfico de cada comunidade.
Os anos 60 assistiram a confrontos esporádicos entre as duas comunidades. Em 1974, os partidários da enosis promoveram um golpe de Estado, derrubando o governo presidido pelo arcebispo Makários, o “patriarca da independência”. Makários havia defendido a causa, mas a abandonara pois julgava que o tempo da união de Chipre à Grécia tinha passado.
A derrubada do governo Makários forneceu um pretexto para que o governo turco invadisse Chipre, alegando defender os interesses da minoria turco-cipriota.
A invasão quase provocou uma guerra entre Grécia e Turquia, governadas à época por ditaduras, mas a mediação de Washington, amparada por fortes ameaças, evitou que a fagulha degenerasse em explosão no flanco sudeste da OTAN.
Contudo, desafiando as pressões internacionais, as forças invasoras turcas consolidaram suas posições no norte da ilha, ocupando cerca de 37% do território cipriota. Cerca de 200 mil greco-cipriotas abandonaram áreas ocupadas pelos turcos, enquanto 50 mil turco- cipriotas transferiam-se do sul para o norte. De lá para cá, tropas das Nações Unidas patrulham a faixa fronteiriça entre as duas comunidades, conhecida como linha Átila ou Verde.
Em 1983, os turco-cipriotas proclamaram a República Turca do Norte de Chipre, reconhecida apenas pela Turquia. A decisão cristalizava a partição da ilha. As tentativas da ONU de negociar uma solução política esbarraram no muro das desconfianças mútuas e na eterna discussão sobre a representação política das duas comunidades. A parte grega de Chipre saiu-se melhor que a turca. A guerra civil no Líbano, entre 1975 e 1991, subtraiu a esse país o papel de pólo financeiro regional, que passou a ser desempenhado por Chipre. Além disso, a parte grega beneficiou-se das rendas do turismo e, indiretamente, da relativa prosperidade experimentada pela Grécia desde a adesão à Comunidade Européia, em 1981. A “Chipre grega” exibe PIB per capita em torno de 15 mil dólares, enquanto a “Chipre turca”, de cerca de 6 mil dólares.
As pressões internacionais para a reunificação aumentaram em 1998, quando a parte grega de Chipre solicitou sua adesão à UE. Em 2002 foi lançado pela ONU o Plano Annan, que previa a reunificação num república confederal, formada por um Estado grego e um turco. Mas o referendo popular, realizado no fim de abril, implodiu o projeto. Na parte grega, 78% dos eleitores rejeitaram a reunificação. Na parte turca, o plano foi aprovado.
Com esse resultado, desastroso do ponto de vista da ONU e da UE, apenas a parte grega ingressa no bloco europeu.
Agora, contudo, desaparecem os argumentos contrários ao reconhecimento internacional da República Turca do Norte de Chipre.

Boletim Mundo Ano 12 n° 3

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