Nenhum acontecimento foi tão marcante na formação cultural do Rio Grande do Sul quanto esta guerra de dez anos (1835 -1845), em que se misturaram interesses econômicos, disputas políticas ferozes e ideais libertários, como a República e a libertação dos escravos. Todos estes fatores, deve-se assinalar, despertaram polêmicas intensas entre os participantes do movimento.
As primeiras evocações históricas da guerra, sobretudo depois da proclamação da República, eram de apologia quase incondicional do movimento: nele teria se formado o “caráter” peculiar do gaúcho, sóbrio, valente, o “monarca das coxilhas”. Depois se desenvolveu uma visão mais crítica, em que despontavam as motivações econômicas da guerra, sobretudo a taxação excessiva do charque local, que favorecia a importação do charque platino. O charque era o principal produto alimentar das populações pobres brasileiras, incluindo os escravos, e a disputa de seu mercado era muito séria.
Também se ressaltavam os fatores políticos imediatos, como a insatisfação dos estancieiros com a nomeação de presidentes da província, ineptos e ligados ainda aos interesses lusitanos remanescentes.
Na verdade, os fatores econômicos e políticos são fundamentais para se situar a guerra num contexto adequado. Mas não se pode explicar dez anos de guerra, mais a proclamação de uma república e a formação das brigadas de cavalaria dos lanceiros negros, apenas pelo imposto sobre o charque ou uma disputa pela presidência da província. Houve, sim, a infiltração de ideais libertários na agenda da classe dominante local, sobretudo a partir de três tipos de personagens envolvidos no conflito. O primeiro deles era a oficialidade jovem da região, fortemente influenciada pela corrente “vermelha” (como se dizia) da maçonaria, radical, republicana e abolicionista, e também exposta aos ideais republicanos que acabaram triunfando (também com ajuda da maçonaria) no vizinho Uruguai. A segunda era a de líderes oriundos de uma incipiente classe média, numericamente pequena mas barulhenta, pelo menos no começo da guerra, como o Padre Chagas, Pedro Boticário e o escritor Caldre e Fião (que depois rompeu com os Farrapos quando passou a duvidar da veracidade de seus ideais abolicionistas). O terceiro era a presença dos italianos, que compunham uma verdadeira “Internacional Republicana” comandada por Mazzini a partir de Londres.
Como a coroa do Império Brasileiro pertencia aos Bragança, e estes eram ligados política e familiarmente aos Habsburgo, do Império Austro-Húngaro, que dominava o norte da Itália, para esses italianos lutar contra as forças imperiais na América do Sul era também lutar contra aliados de seus inimigos europeus. Destacaram-se, entre os muitos italianos envolvidos com a causa dos Farrapos, o Conde Tito Lívio Zambeccari, Luigi Rossetti, intelectual brilhante que chegou a ser redator de “O Povo”, diário oficial da república, e Giuseppe Garibaldi, cuja fama e aura correriam o mundo.
Parte dessa fama e dessa aura deveu-se a seu envolvimento com Anita, mulher que encontrou em Laguna, Santa Catarina, quando os republicanos a tomaram, em busca de um porto. Anita casou-se com Garibaldi e o acompanhou pelo resto de sua vida, até morrer nas lutas pela unificação da Itália, em 1849, quando teria cerca de vinte e oito anos de idade. Garibaldi e Anita, cognominados “os heróis de dois mundos”, deram a aura romântica necessária à constituição de uma legenda moderna, como a da Guerra dos Farrapos.
Sem dúvida, o sucesso que a mini-série da Rede Globo vem obtendo junto ao público se deve também à história dessa paixão desabrida que uniu os dois em meio a uma guerra civil. Também penso que o sucesso se deve (isso pode parecer paradoxal) ao desconhecimento por parte da maior parte do público (fora do Rio Grande do Sul) dos detalhes ou mesmo das generalidades em torno dessa guerra. A visão de nossa história com freqüência se dividiu entre a exaltação oca de heróis duvidosos, ou a ironia deslavada em relação a esses mesmos heróis. É “natural” que, neste contexto, o público seja atraído pela visão de líderes republicanos autênticos e personagens apaixonados e apaixonantes, como Garibaldi, Rossetti, Anita e outros. É necessário, creio, manter um cuidado nesta admiração: a minissérie, sobretudo, na adaptação do romance, não está tratando propriamente da “história” do Rio Grande do Sul, mas sim de sua “mitologia”. E nisto não vai crítica: estamos diante de uma obra de ficção, não de um tratado histórico.
Boletim Mundo Ano 11 n° 2
muinto bon eci testo
ResponderExcluirConkordo con o camarada asima! mim ajuduo demas
ResponderExcluirthis text helped me understand the complexity of the subject discussed, thanks
ResponderExcluirلدي قضيب كبير جدا لكنه يسقط ح كبير جدا لكنه يسق
ResponderExcluirfalaru tudo aí em çima,,, nosa joaum! voce podria escreve um livro com tanto conhecimento, parabéns!
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