Após deixar o Brasil, Bush visitou Uruguai, Colômbia, Guatemala e México. O propósito foi lançar “pontes” com os governos latino-americanos e tentar recompor relações políticas e diplomáticas desgastadas por seis anos de uma gestão desastrosa, que praticamente ignorou a existência dos países ao sul do rio Grande. A influência de Hugo Chávez cresceu no vácuo do distanciamento da Casa Branca, associado a uma política arrogante e expansionista, que gerou inimigos e opositores em todo o mundo. Bush, agora, tenta remediar, e joga a cartada do isolamento do presidente venezuelano.
A “cooptação” do Brasil é fundamental nesse jogo, dada a importância do país no continente. Lula e Bush voltaram a se encontrar, em 31 de março, desta vez em Camp David, nos Estados Unidos. Por outro lado, em abril, a valsa de encontros envolve os presidentes brasileiro e venezuelano, em Caracas.
“Do ponto de vista americano, o mais importante dessa viagem (de Bush) é a visita ao Brasil. México e Colômbia têm uma prioridade estabelecida por temas como fronteira, migração, segurança e intercâmbio econômico.
Mas o Brasil é visto como uma liderança de esquerda democrática com possibilidade de ter influência moderadora sobre Venezuela e Bolívia”, afirma Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington. Avaliações semelhantes foram feitas por Celso Lafer, ministro das Relações Exteriores do governo Fernando Henrique Cardoso, e por muitos outros analistas e especialistas em relações internacionais.
Contra todas as evidências, Nicholas Burns, subsecretário de Assuntos Políticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos, preferiu apontar numa outra direção.
“Não fazemos tudo pensando em Hugo Chávez, não vamos dormir pensando nele e não estamos obcecados com ele. Todos sabem o que ele é e o que ele representa.
Nós representamos algo diferente. Representamos um agenda positiva, que é a agenda necessária para sermos bem-sucedidos.” Mas Bush jamais escondeu que, para ele, Chávez representa um incômodo maior do que Fidel Castro: os petrodólares conferem ao presidente venezuelano uma projeção política e um poder de fogo jamais obtidos pelo cubano.
Aliás, um dos aspectos mais urgentes da “missão Bush” no Brasil foi acertar um acordo para diminuir a dependência dos Estados Unidos em relação ao petróleo venezuelano.
O memorando – oficializado pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e pela secretária de Estado dos Estados Unidos, Condoleezza Rice – aponta nessa direção, mas esbarra num problema até agora intransponível: o protecionismo americano. O governo brasileiro quer que Washington suspenda as taxas de importação do etanol que protegem os produtores de seu país. Bush alega que isso é impossível, pois teria que ser uma decisão aprovada pelo Congresso americano.
Repete-se, enfim, o velho impasse que sempre conduziu ao fracasso todas as tentativas de acordos comerciais multilaterais.
Uma das alternativas, até agora descartada, seria registrar o etanol, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) como um bem energético e não como commodity agrícola. Poderia, assim, escapar aos acordos internacionais que regulamentam o comércio desse tipo de produto, permitindo, eventualmente, que os Estados Unidos suspendam as barreiras protecionistas à importação do álcool. Para isso, Bush teria que exibir os músculos no cenário político doméstico e demonstrar uma vontade política pouco provável, para um governo cuja popularidade despenca no ritmo do fiasco no Iraque.
Em contrapartida, Bush exige que o governo brasileiro permita que empresas americanas controlem as usinas, diretamente ou por meio de joint-ventures. Caso isso de fato aconteça, significaria a desnacionalização do setor canavieiro. “Ano passado, 3,4% do setor estava desnacionalizado; este ano chegará a 5%. Em dez anos, metade não será mais brasileira”, afirma o usineiro Maurílio Biagi Filho, que vendeu, em 2006, a área industrial de sua usina Cevasa, em Patrocínio Paulista, para a transnacional Cargill.
O setor espera exportar 4 bilhões de litros de álcool este ano, ante 2,3 bilhões em 2006, que renderam US$ 1,6 bilhão, o dobro de 2005. Em quatro anos, serão investidos US$ 2,5 bilhões na produção de álcool e devem ser implantadas 77 novas usinas até 2012. No Brasil há 6 milhões de hectares de canaviais, área que cresceu 13% nos últimos três anos. Em São Paulo, só em José Bonifácio, a área plantada triplicou nas duas últimas safras. No Centro- Sul, a área canavieira deverá crescer de 4,6 milhões para 5 milhões de hectares. A expansão ocorrerá principalmente no eixo Oeste Paulista- Triângulo Mineiro-sul de Goiás, por onde deve passar um duto destinado a escoar álcool para os portos do Sudeste.
Boletim Mundo n° 2 Ano 15
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