Tudo previsto. Até porque Israel tem no currículo a destruição do reator nuclear iraquiano Osirak, em 1981, levada a cabo pela Força Aérea. Tudo previsto. No papel, é claro: uma intervenção militar israelense no Irã seria operação militar de altíssimo risco e representaria um golpe duro nas perspectivas de paz no Oriente Médio para as próximas décadas.
As dificuldades começam pela geografia. As instalações nucleares do Irã – com destaque para as plantas de Natanz e Arak e o reator de Bushehr – ficam centenas de quilômetros mais longe do que o Osirak iraquiano. Espertos, os técnicos iranianos construíram as três plantas a centenas de quilômetros uma da outra, o que transforma um ataque simultâneo em pesadelo de logística. Também não seria tranqüilo para os israelenses pilotarem seus aviões pelo espaço aéreo da Jordânia, Arábia Saudita e Turquia. E as defesas aéreas do Irã são muito mais avançadas que as do Iraque de 1981. Um desembarque por terra parece ainda mais improvável.
Outro problema grave é que, segundo cientistas que participaram do programa nuclear do Iraque e depois deixaram o país, o ataque a Osirak representou apenas um golpe momentâneo. Quando Saddam Hussein invadiu o Kuwait, em 1990, seus cientistas estavam muito perto de produzir uma bomba-A.
O programa atômico iraniano tem história.
Graças às reservas de petrodólares, o Irã construiu nos últimos 20 anos uma ampla teia de parcerias – com a China, Rússia, Paquistão, Coréia do Norte e Ucrânia – para alcançar a bomba-A. E foi o maior beneficiário do desmantelamento parcial dos antigos estoques de armas atômicas da União Soviética, por conta da aliança com as repúblicas islâmicas da ex- URSS. O pai do programa atômico iraniano foi Abdul Qhader Khan, que chefiou programa semelhante no Paquistão.
O Irã é, também, o maior freguês de mísseis de origem russa e norte-coreana. O Shehab-2, uma variante do Scud-C russo, transporta carga de 700 quilos à distância de 500 quilômetros e pode atingir bases americanas no Iraque, Kuwait, Catar e Omã.
O Shehab-3, variante do Nodong norte-coreano, poderia transportar ogivas nucleares à distância de 1,3 mil quilômetros, atingindo as cidades de Tel Aviv e Haifa, em Israel, e o reator nuclear israelense de Dimona.
Esses mísseis estão prontinhos para uso.
O programa iraniano é uma ameaça real a Israel. Mas, se os israelenses têm possibilidades reduzidas de suprimi-lo, o que pretendem com suas ameaças de ataque?
Ao que tudo indica, a batalha verbal tem dois objetivos: refrear a corrida nuclear do Irã e forçar as potências mundiais, principalmente os Estados Unidos, a adotarem medidas reais de contenção.
Israel, aliás, já fez isso. Às vésperas da Guerra do Golfo, em 1991, os israelenses chegaram a ameaçar um ataque nuclear “reduzido” contra Saddam Hussein. O ataque não existiu, mas a ameaça talvez tenha surtido efeito: os Estados Unidos de fato invadiram o Iraque, que lançou mísseis contra Israel mas não utilizou suas armas mais assustadoras, como ogivas carregadas com armas químicas.
O curioso é que o governo iraniano, apesar das freqüentes ameaças contra Israel, provavelmente pretende apenas usar o poderio nuclear como força de dissuasão, para evitar um hipotético ataque dos Estados Unidos. Parece que, como Israel, o Irã elabora planos de ataque para jamais atacar - e, sim, para ganhar pontos no equilíbrio regional de poder.
Mas as corridas armamentistas têm sua própria lógica e nem sempre podem ser controladas.
Na Europa do início do século XX, as potências armaram-se até os dentes. Ninguém queria ir à guerra, até que um evento acidental acionou as máquinas de matar.
Veio a Primeira Guerra Mundial, que deixou 60 milhões de mortos.
Boletim Mundo n° 1 Ano 15
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