Leandro Narloch
Poucos seres humanos viveram tão intensamente uma época e são um retrato tão perfeito dela quanto o renascentista Andreas Vesalius. Desde criança, o garoto de Bruxelas divertia-se abrindo corpos de animais. Jovem, estudou grego, versou-se em literatura. Quando conheceu a anatomia clássica, misturou-os com a explosão de criatividade do Renascimento, criando o De Humanis Corporis Fabrica, (Sobre a Construção do Corpo Humano). Caso raro entre tudo que o homem botou no papel, o livro é uma das grandes obras de arte do século 16 e, ao mesmo tempo, assinala o início da ciência moderna entre nós.
Produzida como um compêndio para estudantes de medicina, a Fabrica, reeditada 460 anos depois pela Unicamp, é a primeira coletânea de observações sobre o corpo humano feitas com base no método experimental. Como Copérnico, que também em 1543 deslocou a Terra do centro do universo, Vesalius revelou a estrutura real do corpo humano, decretando o fim da medicina medieval. “Esse livro não é somente o alicerce da medicina moderna como ciência, mas a primeira grande realização da própria ciência em tempos modernos”, escreveu, na década de 50, o historiador inglês Charles Singer.A impressão, com moldes de madeira, desses desenhos (feitos por gente como Ticiano), também revolucionou a tipografia. O próprio Vesalius produziu alguns desses infográficos, revelando como os conceitos de arte e ciência ainda se misturavam no Renascimento. Aliás, era por amor à arte que ele se aventurava a retalhar defuntos e analisar vísceras. Renascentista, enxergava o corpo como obra de arte, devendo assim ser glorificado e engrandecido, em posturas e cenários de suas ilustrações anatômicas que encantam ainda hoje.
Revista Aventuras na História n° 009
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