Centenas de milhões de pares de olhos vidrados assistiam pela TV – ao vivo! – ao astronauta americano Neil Armstrong descer pela escada do módulo espacial Eagle, transportado pela nave Apollo 11, e dar os primeiros passos, desajeitados, na superfície da Lua. Atrás dele viria o colega Edwin Aldrin. O terceiro astronauta, Michael Collins, permaneceu em órbita lunar e ajudou a plantar a Star and Stripes, a
bandeira americana em um novo território. A Terra não era suficiente para a Guerra Fria entre americanos e soviéticos. Ela chegava ao espaço e, com a “conquista da Lua”, os Estados Unidos assumiam a ofensiva.
Na verdade, a disputa pelo espaço começou com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, quando Estados Unidos e União Soviética, as superpotências vencedoras, arrebanharam cientistas, projetos e planos do programa alemão de foguetes, o mais evoluído do mundo, que tivera início em 1935. A disputa pelo espaço
na verdade fazia parte de algo muito maior – a luta pela hegemonia mundial entre as grandes potências nucleares.
Mas não se tratava “apenas” de uma corrida para ver quem conquistaria primeiro o espaço. Quem desenvolvesse mais rapidamente a tecnologia de foguetes
espaciais levaria vantagem no aperfeiçoamento de mísseis balísticos militares, capazes de carregar, através dos continentes e oceanos, ogivas nucleares que explodiriam no território do inimigo. Apenas oito anos antes do passeio de Armstrong na Lua, o mundo esteve à beira de uma guerra nuclear, por conta da instalação de mísseis soviéticos em Cuba, pertinho dos Estados Unidos.
E não por acaso, o cientista Wernher Von Braun, um dos chefões do desenvolvimento das bombas-voadoras V1 e V2 alemãs, que fizeram grande estrago em Londres durante a Segunda Guerra Mundial, foi o pai do programa espacial americano.
A União Soviética saiu na frente da correria, ao lançar o primeiro satélite espacial, o Sputnik 1, em 1957.
No mesmo ano, os soviéticos colocaram no espaço o primeiro ser vivo, a cadelinha Laika, a bordo do Sputnik 2. Eram os melhores momentos da potência comunista que apostava na “coexistência pacífica” pois, nas palavras célebres do seu líder Nikita Kruschev, “alcançaria e ultrapassaria” o nível econômico dos Estados Unidos.
O gol de placa soviético viria, porém, em 1961, quando a sonda Venera chegou a Vênus e o país colocou o primeiro homem em órbita terrestre. O cosmonauta Yuri Gagarin ganhou as manchetes mundiais ao berrar, emocionado, pelo rádio de bordo: “a Terra é azul!”. Era a primeira vez que um ser humano contemplava o planeta inteiro, uma imagem hoje banalizada pela mídia.
Assustados, nos anos seguintes, os Estados Unidos pisaram firme no acelerador de seu programa espacial, investiram fortunas e jogaram todo o peso da sua liderança tecnológica. No ano do vôo de Gagarin, o presidente John Kennedy anunciou a meta de colocar um astronauta na Lua em uma década. A União Soviética foi ficando para trás. 1969 foi o cumprimento da promessa de Kennedy. Depois, eufórico com o sucesso do foguete Apollo 11, o governo americano prometeu desembarcar um astronauta em Marte em 1985. Isso não ocorreu, principalmente porque a economia soviética enfraqueceu- se bastante nos anos 80 e a Casa Branca reduziu os gastos com o programa espacial. É verdade que, em 1971, a União Soviética havia colocado em órbita a primeira estação espacial, a Salyut, seguida pela americana Skylab, em 1973. Isso daria outro rumo à exploração do espaço, com o surgimento de uma nova geração de naves, os ônibus espaciais. Mas, a essa altura, a capacidade de investimento dos soviéticos no setor havia caído bastante.
É preciso estabelecer uma diferença entre os programas espaciais das duas superpotências. Embora elas tivessem um mesmo objetivo – desenvolver simultaneamente as tecnologias espacial e militar –, havia uma diferença fundamental entre os dois programas.
Para os americanos, tratava-se também de uma disputa de mercado: desenvolver tecnologias que, transplantadas para o âmbito civil, pudessem gerar grandes lucros às suas empresas. E um dos gargalos da economia soviética era exatamente o fato de que as altíssimas tecnologias espaciais e militares geradas por seus cientistas não eram transformadas em vantagens de mercado. O tradutor e ensaísta Boris Schnaidermann sintetizou esse dilema, certa vez, com a frase: “A União Soviética é capaz de construir o míssil mais moderno do mundo mas não consegue criar uma torradeira que preste”.
No fim das contas, foi o modelo americano que deu certo. A corrida espacial, no lado dos Estados Unidos, traduziu-se ao longo das décadas em novas tecnologias de telecomunicações e informática que asseguraram que o país se conservasse como a mais importante economia do mundo. Quando Armstrong dava seus passinhos na Lua, naquele fim de tarde brasileiro de 1969, não sabia que, além de cravar um golaço para Tio Sam na corrida especial e na Guerra Fria, estava também inaugurando uma era de grandes negócios.
Boletim Mundo Ano 12 n° 4
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