Existe mais de uma versão para a origem da expressão, que
até hoje possui duplo sentido. "Em geral, é usada para designar o sujeito
destemido, mas também pode ser dita em tom de ofensa, quando a valentia vira
prepotência", diz o linguista Flávio de Giorgio, da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). No Dicionário do Folclore
Brasileiro, o folclorista Luiz da Câmara Cascudo afirma que "cabra"
era como os navegadores portugueses chamavam os índios que "ruminavam o
bétel", uma planta com folhas de mascar. Com o passar do tempo, o bicho
pode ter virado sinônimo de homem forte por causa de seu leite, considerado
mais denso e nutritivo que o da vaca. Tudo indica que a associação com
"peste" surgiu por causa da má fama da cabra, considerada um animal
simpático ao diabo na tradição sertaneja. Vale lembrar que os nordestinos
também usam a palavra "peste" para nomear doenças graves.
Assim, o "cabra
da peste" seria o sertanejo que sobreviveu superando todos os sofrimentos,
"da dentição difícil, do sarampo certo, da caxumba, da desidratação
inevitável, da catapora, da coqueluche, da maleita e do amarelão, e de tudo
mais que atormenta a vida de um cristão nascido no Nordeste", como sugere
o folclorista Mário Souto Maior no livro Como Nasce um Cabra da Peste.
"Por tudo isso, a expressão completa só deve ter surgido por volta do
século 17", afirma Flávio. Mas alguns especialistas defendem outra
hipótese. A expressão seria uma variação de "cabra-de-peia", também
usada para indicar a valentia do nordestino, que apanhava sem reclamar.
"Depois de açoitada com a peia (chicote), a vítima era obrigada a beijar o
açoite na mão do seu algoz", diz o etimologista Deonísio da Silva, da
Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).
Revista Mundo Estranho Edição 11/ 2003
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