Líderes religiosos e
cientistas têm um longo histórico de discordância na tentativa de explicar o
homem e o mundo.
Estão liberadas no Brasil pesquisas com células-tronco
retiradas de embriões humanos. A Lei de Biossegurança foi aprovada em março,
apesar da movimentação da Igreja e de grupos antiaborto. Os opositores da lei
se baseiam na crença de que o ser humano tem alma desde a fecundação, e por
isso destruir um embrião é assassinato. Os favoráveis a ela se apóiam no fato
de as células-tronco (que podem se transformar em qualquer tecido do corpo)
serem uma chance de cura para vários tipos de doença, de mal de Parkinson à paralisia dos
membros.Não é a primeira vez, nem decerto será a última, que dogmas religiosos se opõem a pesquisas científicas. As religiões nasceram como uma maneira de explicar a natureza aos homens e responder a perguntas difíceis – como de onde viemos, por que chove, o que é um relâmpago, por que as pessoas morrem. Porém, as respostas da religião não costumam mudar com o tempo. As da ciência, sim. A consequência lógica desse descompasso é que muitas questões passaram a ter (no mínimo) duas respostas: a religiosa e a científica. Muitas vezes conflitantes.
Choques com as idéias científicas não se resumem à Igreja Católica. Em 1553, Calvino condenou à morte o médico Michel Servet, responsável pela descoberta da circulação sanguínea. A justificativa: as idéias de Servet a respeito da Santíssima Trindade eram consideradas heréticas. Hoje em dia, as religiões continuam influenciando o desenvolvimento da ciência. Se não queimando gente em fogueiras em praça pública, ao menos direcionando verbas para pesquisas e fazendo lobby contra ou a favor de determinadas leis.
Religião x Ciência
Nessa guerra de
idéias, estão em jogo conhecimento, interesses políticos, fundamentalismo
religioso e até rituais indígenas.
Biblioteca de
Alexandria
Segundo uma das versões, a biblioteca de Alexandria foi
incendiada em 22 de dezembro de 640 pelos muçulmanos. A justificativa: “Se
esses livros contradizem o Alcorão, devem ser destruídos. Se eles repetem as
palavras do Alcorão, são desnecessários – e devem ser destruídos”. Mas é
provável que essa seja apenas a versão dos cristãos, verdadeiros responsáveis pela
destruição do local durante os saques a Alexandria – neles, manuscritos gregos
raros, por exemplo, se perderam. Também em Alexandria, cristãos assassinaram
Hipátia, a quem foram atribuídas invenções como o astrolábio e o hidrômetro. A
mulher não era bem vista pela Igreja, que começava a dominar a região. Em 415,
foi atacada por monges cristãos seguidores do bispo Cirilo e esfolada até a
morte. Depois desse episódio, filósofos, matemáticos e pensadores de todo tipo
resolveram abandonar a cidade, que deixou de ser o centro de ensino do mundo
antigo – e a ciência retrocedeu bastante no Ocidente a partir desse período.
Giordano Bruno
No final do século
16, o filósofo e matemático italiano apoiou-se na teoria que Copérnico
publicara décadas antes de que a Terra girava em torno do Sol (e não o
contrário) e foi além: afirmou que o Universo é infinito e que o Sol é apenas
uma de muitas estrelas. Foi perseguido, torturado e preso como herege por sete
anos até que a Santa Inquisição o julgou culpado. Em 1600 se recusou a negar
suas idéias e foi queimado vivo. Antes disso, sua língua foi cortada para que
ele não pudesse falar ao público que assistia à execução. Embora o modelo
heliocêntrico fosse de Copérnico, ele não chegou a ser perseguido, porque
morreu dois meses depois da publicação de suas idéias. Galileu Galilei foi
outro que teve problemas quando tornou pública sua simpatia pelo
heliocentrismo. Foi condenado, em 1633, a negar publicamente suas idéias e
passou o resto da vida em prisão domiciliar.
Homem de Kennewick
Encontrado em 1996 em
Washington, o “Homem de Kennewick” é um dos mais completos e antigos esqueletos
humanos das Américas. Logo após sua descoberta, porém, quatro tribos indígenas
locais exigiram a posse do fóssil, para que ele pudesse ser enterrado de acordo
com seus rituais. No entanto, um exame de seus ossos determinou características
físicas caucasianas e descobriu que ele tem cerca de 9 mil anos de idade,
impossibilitando qualquer relação de parentesco com os nativos americanos. A
descoberta pode indicar que a povoação das Américas conta com um fluxo
migratório da Ásia, através do Estreito de Bering. A disputa na Justiça
continua até hoje – em 2004, os cientistas ganharam o direito de estudá-lo, mas
os índios recorreram. Desde 1998 os ossos estão no Burke Museum, em Washington.
Charles Darwin
Charles Darwin
publicou A Origem das Espécies em 1859,
livro baseado nas observações e fósseis coletados durante a viagem de cinco
anos no navio HMS Beagle. Na obra, ele expunha sua “Teoria da Evolução”,
afirmando que as espécies animais evoluem de outras menos desenvolvidas. E
incluiu o ser humano nessa história, como descendente dos primatas. Com isso,
Darwin provocou reações violentas por parte da Igreja – e dos acadêmicos, que
promoveram discussões ferrenhas e o chamavam de “ape” (macaco). A polêmica
teoria dividiu opiniões mas, assim como a de Copérnico, foi aceita como a
versão correta dos fatos. Nos últimos anos, no entanto, grupos religiosos têm
se posicionado contra o ensino da teoria da evolução nas escolas, insistindo em
aceitar como verdadeira a versão bíblica da criação do homem – aquela mesmo, de
Adão e Eva.
Budas de Bamiyan
As estátuas gigantes
dos Budas de Bamiyan, com 53 e 38 metros, são representantes da arte greco- budista,
nascida da expansão da cultura grega pelo Oriente. Localizadas no Afeganistão,
resistiram a cerca de 1 800 anos expostas ao tempo. Em 2001, a milícia Talibã
decidiu explodir completamente os monumentos, como parte de uma campanha
destinada a acabar com todas as imagens não- islâmicas na região (e, assim, com
a matéria-prima de arqueólogos e historiadores). No esforço internacional de
reconstruir as estátuas, pesquisadores estão achando fragmentos das esculturas,
assim como novas informações sobre o intercâmbio cultural da época da
construção – se as estátuas tivessem sido poupadas, as pesquisas certamente
seriam facilitadas.
Aventuras na História
n° 021
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