Rodrigo Ratier
Vários crimes contra a natureza são dolorosamente
memoráveis. O primeiro a chamar atenção mundial foi a destruição atômica em
Hiroshima e Nagasáki, no Japão, que matou pelo menos 150 mil japoneses e deixou
o ambiente local radioativo por décadas. Outra tragédia nuclear, a explosão de
um reator na usina de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, tirou a vida de 10 mil
pessoas e afetou milhares de quilômetros de florestas. Outras tristes
lembranças são os derramamentos de óleo no mar do Alasca, em 1989, e na costa espanhola,
no ano passado. Ou o vazamento de gases tóxicos em Bhopal, na Índia, em 1984, considerado o
pior acidente químico da história. Em nosso mosaico de desastres ecológicos,
entraram fatos causados pelo homem que provocaram grande dano à natureza em um
curto espaço de tempo."São catástrofes sérias por causa das perdas de vidas, mas são desastres pontuais. As verdadeiras tragédias ambientais ocorrem durante décadas e destroem ecossistemas locais", afirma a naturalista Dejanira de Franceschi de Angelis, professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Rio Claro (SP). Exemplos disso são o avanço do buraco na camada de ozônio ou do efeito estufa, que podem comprometer a vida no planeta. Ou ainda o desmatamento das florestas brasileiras. Nos 503 anos de colonização, a Mata Atlântica perdeu 93% de sua cobertura original. Em um tempo bem menor - cerca de 30 anos - sumiram 20% da área da Amazônia e 80% do cerrado. "Esse último ecossistema deve levar milhões de anos para se recompor", diz o biólogo José Maria Cardoso da Silva, da ONG Conservation International.
Isso sem contar o lado invisível do drama da devastação: junto com as árvores e os animais mortos, desaparece também a vida microscópica. "Sem os microorganismos, a vida na Terra está seriamente comprometida", diz Dejanira.
Sete catástrofes internacionais...
Produtos nucleares e derivados do petróleo foram os grandes
vilões.Petróleo
Derrame do Prestige (2002) - Presente de grego
Em novembro do ano passado, o petroleiro grego Prestige naufragou na costa da Espanha, despejando 11 milhões de litros de óleo no litoral da Galícia. A sujeira afetou 700 praias e matou mais de 20 mil aves. Em comparação com o Exxon Valdez, a quantidade de óleo derramado foi menor, e a biodegradação do produto foi facilitada pelas temperaturas mais altas. Nos meses seguintes ao desastre, o submarino-robô Nautile soldou o navio afundado a 3 600 metros de profundidade. Mas, como a vigilância diminuiu, os ambientalistas alertam que vazamentos pequenos ainda podem acontecer.
Queima de petróleo no
golfo Pérsico (1991) - Crime de guerra
Obrigado a deixar o Kuwait, nação que havia invadido, o
ditador iraquiano Saddam Hussein ordenou a destruição de cerca de 700 poços de
petróleo no país. Mais de 1 milhão de litros de óleo foram lançados no golfo
Pérsico ou queimados. Como a fumaça dos poços bloqueou a luz do Sol e jogou um
mar de fuligem no ar, ao menos mil pessoas morreram de problemas respiratórios.
A mancha viscosa de 1 500 km2 matou 25 mil aves e emporcalhou 600 quilômetros
da costa. Como o petróleo se infiltrou no solo, as sementes não germinam, 40%
da água subterrânea foi contaminada e a terra quase não absorve água.
Derrame do Exxon
Valdez (1989) - Gelada ecológica
Em março de 1989, o
petroleiro Exxon Valdez colidiu com rochas submersas na costa do Alasca e deu
início ao mais danoso derramamento de óleo por um navio. O saldo do despejo de
40 milhões de litros de óleo incluiu 100 mil aves mortas e 2 mil quilômetros de
praias contaminadas. O problema se agravou porque, no frio, o óleo demora para
se tornar solúvel e ser consumido por microorganismos marítimos - a
biodegradação ocorre com eficácia apenas a partir dos 15 ºC. Apesar da limpeza
(foto maior), que mobilizou 10 mil pessoas, cerca de 2% do petróleo continuam
poluindo a costa da região.
Químico
Poluição em Minamata
(1956) - Vergonha oriental
Em 1956, pescadores
dessa baía japonesa começaram a ter uma doença batizada de mal de Minamata, que
causava paralisias e podia matar. Logo ficou claro que os casos surgiram porque
uma indústria de fertilizantes, a Chisso Corporation, lançou durante quatro
décadas 27 toneladas de mercúrio no oceano, contaminando peixes e frutos do
mar. Mais de 3 mil pessoas adoeceram e centenas morreram. A região só foi
declarada livre de mercúrio em 1997, quando as redes que impediam os peixes
contaminados de nadar para outras águas foram retiradas.
Vazamento em Bhopal
(1984) - Omissão fatalNa madrugada de 3 de dezembro de 1984, 45 toneladas de gases tóxicos vazaram de um tanque da fábrica de agrotóxicos da Union Carbide, em Bhopal, na Índia. Depois do acidente, a empresa simplesmente abandonou o local e 2 500 pessoas morreram pelo contato com as substâncias letais. Outras 150 mil sofreram com queimaduras nos olhos e pulmões. Os protestos pela limpeza da área são constantes (na foto abaixo, uma manifestação de 2002). Até hoje, o solo e a água têm altos níveis de metais pesados e derivados de cloro cancerígenos.
Nuclear
Explosão de Chernobyl
(1986) - O preço do descaso
"Camaradas, pela
primeira vez, enfrentaremos a energia nuclear fora de controle." Com essas
palavras, o presidente da União Soviética Mikhail Gorbachev anunciava, em abril
de 1986, o pior acidente nuclear da história: a explosão de um dos quatro
reatores de Chernobyl, na Ucrânia (uma ex-república soviética).Foi liberada uma
radiação 90 vezes maior que a das bombas de Hiroshima e Nagasáki. Além das 32
pessoas que morreram na hora, outras 10 mil perderam a vida nos anos seguintes.
A nuvem nuclear que atingiu a Europa contaminou milhares de quilômetros de
florestas e causou doenças em mais de 40 mil pessoas.
Bombas de bombas de
Hiroshima e Nagasáki (1945) - Pesadelo atômico
Tidas como um marco
do horror nuclear, as duas explosões de agosto de 1945 mataram entre150 mil e
220 mil japoneses — as estimativas não são precisas porque os documentos
militares da época foram destruídos. Até 1 quilômetro do centro da explosão,
quase todos os animais e plantas morreram com as ondas de choque e calor. Em 58
anos, a radiação aumentou em 51% a ocorrência de leucemia. Hoje, as duas
cidades já possuem índices de radiação aceitáveis.
...E uma brasileira
Poluição em Cubatão produziu bebês sem cérebro e chocou a opinião pública do
planeta
Químico
Em 1980, o jornal
americano The New York Times batizou esse pólo petroquímico paulista de
"Vale da Morte". Na época, as indústrias cuspiam mil toneladas de
gases tóxicos por dia, alimentando uma névoa venenosa que afetava o sistema
respiratório e gerava bebês com deformidades físicas. A sujeira também
contaminou a água e o solo da região, trazendo chuvas ácidas e deslizamentos na
serra do Mar. Com o controle da poluição industrial, a situação melhorou, mas o
lugar está longe de ser um paraíso. O Greenpeace afirma que há riscos de contaminação
no depósito de organoclorados (substâncias tóxicas que podem causar câncer) da
Rhodia e pede a retirada do material. A empresa, por sua vez, diz que eliminou
os contaminantes em dez áreas clandestinas da década 70 e que o depósito atual
possui sistemas de segurança, além de passar por inspeções da Cetesb, órgão de
controle ambiental do governo paulista.
Revista Mundo Estranho Edição 22/ 2003
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