segunda-feira, 2 de abril de 2012

O metrô de Nova York faz 100 anos

Tania Menai

Nova York tem dois andares. E o turista que nunca se aventurou no metrô certamente perdeu metade dela. É ali que se vê a máquina que move a cidade, a mistura de nacionalidades, o violonista, o flautista, o mendigo e a madame. O metrô é às vezes sujo, outras barulhento, mas sempre apaixonante. E assim é desde 27 de outubro de 1904, dia de sua inauguração.
Na época, mais da metade dos então 3,4 milhões de habitantes da cidade de Nova York se aglomerava no sul da ilha de Manhattan. A cidade era movida por bondes e charretes, que não chegavam às regiões mais remotas. Londres e Paris já tinham suas linhas de metrô quando, em 1900, Nova York assinou o contrato com a construtora particular Interborough Transit Company (IRT, hoje MTA, ou Metropolitan Transportation Authorithy). Liderada por um judeu alemão, August Belmont, o homem mais rico da cidade, a IRT empregou 7700 trabalhadores, a maior  parte imigrantes irlandeses e italianos. Salário: 2 dólares por dia. O método de construção tinha nome: “cortar e cobrir”. Além de esburacar mais de 32 quilômetros das ruas da cidade, colocar os trilhos, construir escadas, paredes e tetos, o projeto – que em tamanho só competia com o Canal do Panamá – ainda foi considerado audacioso por outro motivo: fazer tudo isso em apenas quatro anos e meio (a obra do Panamá durou dez).
Ao contrário dos sistemas já existentes em Paris e Londres, o metrô nova-iorquino tinha linhas expressas – que rasgavam a cidade em poucos minutos, em vez do pinga-pinga das linhas que param em todas as estações. Tudo isso pela taxa única de 5 centavos por viagem (hoje sai por 2 dólares), independentemente da distância percorrida. O preço ficou estagnado até 1948, quando dobrou para 10 centavos – mesmo com os custos elevados de manutenção do sistema, os políticos não ousavam aumentar a passagem para não perder votos. Em 1953, introduziu-se o token, moeda furada no meio que valia como tíquete para o metrô. Foi abolida somente no ano passado, quando passou a valer somente o Metrocard, cartão magnético introduzido em 1997.
A primeira viagem foi conduzida pelo então prefeito George McClellan. No evento de abertura, no qual homens aglomeravam-se de fraque para ver a novidade, McClellan empolgou-se acelerando o trem da estação do City Hall (abaixo da prefeitura da cidade) até a rua 145, no norte da ilha de Manhattan. Só no primeiro dia, 150 mil curiosos percorreram a cidade nos novos vagões – os trens chegavam a cada 3 minutos numa velocidade de 72 km/h. Em 1905, o metrô já fazia 1 bilhão de viagens por ano. Graças aos trilhos, as populações do Bronx e do Queens, que em 1900 eram de 201 mil e 153 mil, respectivamente, incharam para 1 milhão cada em 1930. Cenário de piadas, crimes, artistas amadores, filmes e literatura, Nova York seria, simplesmente, impossível sem seu metrô.
Estações e destinos
A cultura subterrânea da "Big Apple"
Estréa macabra
O metrô estreou com percalços e tragédias. No primeiro ano, eram comuns atrasos por incêndios, rompimentos de canos de água e até pelo desaparecimento de cães nos túneis. Em setembro de 1915, quando a estação 23 estava sendo construída, a rua desabou dentro do buraco do metrô sugando até um bonde – em plena Sétima Avenida. Pouco depois, ali mesmo, o choque entre dois trens matou o condutor de um deles, de 17 anos. Tantos problemas provocaram uma greve dos funcionários já nos primeiros meses. E a primeira peça de teatro sobre o metrô reforçou sua atmosfera obscura: tratava de maridos insatisfeitos que mataram suas esposas jogando-as nos trilhos.
Ventinho divino
A cena de cinema mais célebre do metrô não foi rodada em seus vagões, mas na calçada acima. No dia 15 de setembro de 1954, na esquina da avenida Lexington com a rua 52, Marilyn Monroe deixou suas saias esvoaçarem no filme O Pecado Mora ao Lado, vista por 2 mil fãs. Numa noite de verão, The Girl – o papel de Marilyn – saía do cinema com o vizinho quando aproveitou o vento vindo dos túneis para se refrescar. “Não é delicioso? Você não desejaria usar saias?”, diz. A cena foi depois regravada em estúdio, mas a foto da gravação original eternizou a imagem. Muito vento. E muita calcinha.
Embaixo do 111/9
Durante o desastre da queda do World Trade Center, o metrô mostrou sua eficiência em controlar os trens. Ninguém morreu no sistema durante o 11 de setembro de 2001: os condutores foram avisados a tempo e os trens que rumavam para o sul não passaram da rua 14, estação exatamente abaixo das Torres Gêmeas. O sistema voltou a funcionar no final da tarde, da rua 14 para cima. Em agosto de 2003, a cidade percebeu como depende do seu transporte subterrâneo. Durante um blecaute de oito horas, cenas de calamidade foram vistas pela cidade, com milhões de nova-iorquinos tendo que ir para casa a pé.
Miss metrô
Em 1941, para incrementar as jornadas subterrâneas, cuja maioria de passageiros era de homens, a prefeitura de Nova York criou um concurso anual para eleger a mais bela garota do metrô. A escolhida tinha o pôster com sua foto e biografia espalhado por todas as estações e vagões. Ser Miss Subway não era pouca coisa. A primeira escolhida, em 1941, foi Mona Freeman, que ganhou uma carreira em Hollywood. Anos depois, uma manicure do hotel Waldorf-Astoria, Ruth Ericsson, recebeu 258 pedidos de casamento. O concurso terminou em 1976, mas este ano foi reativado para as comemorações do centenário.
Túneis, câmera e ação
Hollywood tem paixão pelo metrô nova-iorquino desde 1933, quando o filme King Kong estreou com o enorme gorila segurando um trem como se fosse um brinquedo. A época mais filmada no metrô foi entre 1970 e 1975, com 36 produções rodadas. O primeiro a exibir tragédias subterrâneas comuns em filmes atuais, como Homem Aranha 2, foi Inferno Subterrâneo, de 1974. Como o filme tratava de um seqüestro no metrô, a administração do sistema só liberou os vagões para filmagem depois que a produtora pagou 275 mil dólares de aluguel e mais 75 mil para seguro anti- sequestro. Hoje, existe até uma estação abandonada na linha 6 que serve apenas para filmagens.

Revista Aventuras na História n° 014

Nenhum comentário:

Postar um comentário