Nelson Bacic Olic
Como se sabe, no 1º de maio se comemora o Dia Internacional do Trabalho. Neste dia, na cidade de Chicago (EUA), no longínquo 1886 grevistas que reivindicavam a redução da jornada de trabalho de 13 para oito horas entraram em choque com a polícia. No embate, morreram vários grevistas e policiais. Em seguida, vários líderes grevistas foram encarcerados, julgados e condenados à morte.
Três anos mais tarde, socialistas reunidos em Paris, fundaram a II Internacional e aprovaram a resolução de consagrar o 1º de maio como o dia internacional dos trabalhadores, em memória aos companheiros mortos em Chicago.
Nem todos os países comemoram o Dia do Trabalho no dia 1º de maio. Um caso particular é o da Austrália onde este dia é comemorado em diferentes datas dependendo da região do país. O mais curioso, é que nos Estados Unidos este dia é comemorado sempre na primeira segunda-feira de setembro.
Todavia, o 1º de maio de 2006 nos Estados Unidos foi diferente. Ocorreram manifestações em várias partes do país no evento que ficou conhecido como “um dia sem imigrantes”. Neste dia, parcela considerável da minoria hispânica, cerca de 14% da população do país, não foi trabalhar e se dispôs a não comprar produtos norte-americanos. De certa forma, mostraram que sua ausência num dia causava enormes transtornos. Em suma, sua ausência seria bem mais notada que sua presença.
Esse tipo de ação teve como referência a obra cinematográfica “Um dia sem mexicanos” do diretor Sergio Arau, na qual todos os latinos que viviam na Califórnia desaparecem causando uma enorme confusão por conta da falta de trabalhadores. O evento foi também uma espécie de coroamento das grandes manifestações que ocorreram em várias grandes cidades em abril, cujo objetivo era repudiar as leis que pretendem criminalizar os imigrantes ilegais que vivem nos Estados Unidos.
É provável que principal herança do debate sobre as leis de reforma da imigração não será nenhuma lei, mas sim essas grandes manifestações realizadas em cidades por todo o país. Foram protestos de massa levada a cabo por uma minoria cuja ambição política está finalmente condizendo com seu tamanho crescente.
Os hispânicos nos EUA vêm chegando há muitos anos, e em quantidades cada vez maiores Hoje eles formam a maior minoria norte-americana, com um contingente de cerca de 41 milhões de pessoas. Entre 2000 e 2005 esse grupo foi responsável por quase metade do incremento demográfico verificado no país. Os dados indicam que o número de imigrantes passou a ser inferior ao da quantidade daqueles nascidos nos EUA.
A maioria dos imigrantes é composta por jovens originários de 22 países. Cerca de 65% seriam oriundos do México, 10% são da América do Sul, 9% salvadorenhos, 6% de origem cubana, dominicana ou guatemalteca. Entre os sul-americanos, mais ou menos metade seria de colombianos e aproximadamente 25%, brasileiros.
Cerca de 40% dos hispânicos vivem em Los Angeles, Nova York e Miami e se acrescentarmos a eles os que vivem em São Francisco, San José e Chicago, chegaremos quase à metade do contingente total desse grupo radicado nos EUA.
Dez estados norte-americanos de grande importância (representam mais de 200 dos 270 votos do colégio eleitoral que elege o presidente do país) concentram mais de 85% da população hispânica como são os casos da Califórnia, Arizona, Novo México, Colorado, Nova York, New Jersey e Flórida.
Todavia, como presença na política nacional, a importância dos hispânicos tem sido bem menor que seu peso demográfico. Recentemente, contudo, cerca de meio milhão de hispânicos e simpatizantes tomaram as ruas de Los Angeles (Califórnia), outro meio milhão em Dallas (Texas) e centenas de milhares por todo o país. Acontecimento inusitado foi o de que tantos imigrantes sem documentos tenham saído das sombras, abdicando de seu anonimato para denunciar uma legislação que ameaça seus interesses. Ainda mais significativo foi o fato de que cidadãos hispânicos legalizados tenham se juntado a eles.
A polêmica sobre as leis de imigração está mais ligada à cultura e ao medo do que com justificativas de caráter econômico. Os imigrantes quer pretendam ficar em caráter permanente, quer pretendam apenas trabalhar de forma temporária estão aprendendo inglês, mas não deixam de usar o espanhol. Assim, já é uma realidade que os Estados Unidos já possuem uma segunda língua e isso atemoriza muita gente já que parte dos brancos não-hispânicos, que se identifica como “autênticos” norte-americanos consideram que os hispânicos seriam responsáveis pela gradual erosão dos “verdadeiros valores da América”.
Estimativas apontam que em 2050, cerca de 25% da população norte-americana, isto é, aproximadamente 102 milhões de pessoas, será de origem hispânica e essa latinização do país será mais intensa na porção sul dos EUA, antigo território mexicano, cuja perda nunca foi totalmente absorvida. Seria uma retomada silenciosa de territórios mexicanos perdidos no século XIX?
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