Nelson Bacic Olic
Com cerca de 400 mil quilômetros quadrados, mais ou menos duas vezes maior que o estado do Paraná, o Cáspio é um mar fechado. Tendo mais de 1.200 km. de comprimento e um máximo de 450 km. de largura, sua extensão costeira se estende por quase 7 mil km., isto é, sua linha de costa é pouco inferior a aquela do Brasil. Apesar de sua profundidade média ser de 180 metros, sua cota máxima chega a atingir 1.025 metros.
Morfologicamente, o Cáspio é dividido em três partes principais. A primeira é a porção norte, que integra a Depressão Aralo-Caspiana (depressão absoluta, cuja altitude média é de –28 m.). Esta é a parte mais rasa, onde a profundidade não supera a cota dos 10 metros. A segunda localiza-se na porção central do mar e possui uma profundidade média de 170 metros. Por fim, a terceira parte corresponde à porção sul, onde estão as maiores profundidades (média de 325 metros). Por conta de seu menor volume e profundidade e por estar localizada junto a áreas continentais baixas e planas, a porção norte é mais vulnerável do ponto de vista dos impactos sócio-ambientais.
Vários rios deságuam no Cáspio, mas o mais importante deles é o Volga, elemento responsável por parte considerável do fluxo de água que chega ao mar. Assim, este curso fluvial é fator fundamental para o estado do Cáspio em relação ao seu equilíbrio aquático, oscilação de nível e constituição química e biológica. Assim, tudo o que acontece ao longo do vale do Volga, tem amplas repercussões sobre o Cáspio.
A bacia do Volga está contida integralmente no interior do território da Rússia e é sobre áreas dessa bacia que se concentra quase metade da população russa e pelo menos um terço da produção industrial e agrícola do país, aspectos que ajudam a explicar os elevados níveis de poluição em quase toda a bacia hidrográfica. Contribuiu também para isso o fato de que, durante o período soviético, as preocupações com o meio ambiente praticamente não existiam. Assim, nos dias que correm, o manejo ambiental integral e sustentável para o Cáspio é impossível sem um programa adequado de ação sobre a bacia do Volga. (clique aqui e veja matéria "No coração de todas as Rússias", na Revista Pangea)
Um outro aspecto que chama a atenção sobre o Cáspio é seu balanço hídrico e suas variações de nível, especialmente se compararmos este último aspecto com aquilo que vem acontecendo, algumas centenas de quilômetros à leste, com o Mar de Aral, cuja superfície líquida reduziu-se dramaticamente nas últimas décadas. (clique aqui e veja matéria sobre o mar de Aral na Revista Pangea)
Durante o século XX ocorreram pelo menos três grandes períodos de mudança no nível geral da superfície do Cáspio. Entre 1900 e 1929, praticamente não ocorreram variações significativas de nível. Todavia, entre 1930 e 1978, houve uma diminuição expressiva e contínua, especialmente entre anos de 1930 e 1941. A causa principal desse fenômeno foi a diminuição do fluxo de água, especialmente dos rios que ali têm sua foz.
De 1978 até os dias atuais, surpreendendo os especialistas, o nível médio do Cáspio subiu cerca de 2,5 metros. As oscilações de nível são típicas em lagos ou mares fechados e isso causa impactos tanto do ponto de vista ambiental como na economia das áreas ribeirinhas. Por exemplo, durante a prolongada queda do nível das águas do Cáspio (1930/1977), acreditava-se que essa era uma tendência irreversível. Assim, planejamentos econômicos foram feitos considerando-se a contínua baixa do nível do mar.
Quando o nível subiu, parte considerável do que foi construído (assentamentos agrícolas, estradas e outras instalações), literalmente foi “por água abaixo”. Nos territórios planos da costa norte e nordeste, áreas atualmente pertencentes à Rússia, os danos acabaram sendo maiores já que um pequeno incremento do nível do mar significa grandes perdas de terras. Até agora os especialistas não têm uma explicação convincente para o recente aumento do nível do mar, nem uma previsão confiável do que poderá acontecer num futuro próximo.
Múltiplos interesses
Durante grande parte do século XX a soberania sobre o Cáspio foi compartilhada entre a União Soviética e o Irã, os dois países que eram banhados pelas águas do mar. Com a desintegração da URSS em 1991, o Cáspio passou a banhar o litoral de cinco países: Irã, Rússia, Casaquistão, Turcomenistão e Azerbaijão, estes últimos quatro surgidos com o fim da União Soviética. Por conta disso, a utilização dos rios, portos, estradas que na época da URSS eram de uso comum, passaram a ser objeto de controvérsias entre os novos países.
Ao mesmo tempo, a descoberta da importância de jazimentos petrolíferos e de gás na região e o interesse ocidental, especialmente dos Estados Unidos, sobre eles estão tornando mais complexas essas disputas e exigindo uma definição jurídica internacional sobre a utilização das águas do Cáspio de seu rico subsolo.
A antiga URSS foi a primeira a criar uma regulamentação jurídica internacional para o Cáspio quando, em 1921, firmou um tratado a esse respeito com o Irã. As disposições desse tratado foram se ajustando até 1940 quando se definiu que a URSS exerceria a soberania sobre 87% do Cáspio e, o restante ficaria sobre o controle do Irã. O acordo, que só tratava das águas superficiais, teve como critério a extensão da linha litorânea dos dois países.Atualmente, os antigos 87% que pertencentes à URSS se encontram distribuídos entre a Rússia (19%), Casaquistão (29%), Turcomenistão (18%) e Azerbaijão (21%).
Ao longo da última década, os cinco países banhados pelo Cáspio têm tido posições conflitantes quanto à definição do estatuto jurídico que deva ser aplicado ao mar, especialmente no que se refere à exploração dos recursos reais e potenciais da plataforma continental. Deve-se lembrar que potencialmente a região do Cáspio é considerada a terceira zona com maiores reservas em hidrocarbonetos do mundo, depois do Golfo Pérsico e da Sibéria.
O novo contexto geopolítico que emergiu após o fim da URSS, a falta de um estatuto jurídico e o enorme interesse de companhias petrolíferas ocidentais na exploração dos recursos da região fazem prever que o espaço “caspiano” seja objeto de tensões geopolíticas e acirradas disputas.
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