Nelson Bacic Olic
Tradicionalmente considera-se que os limites orientais do continente europeu sejam os Montes Urais e, aceitando-se esse fato, o rio Volga é fora de dúvida o maior curso fluvial da Europa em extensão.
Situada inteiramente em território da Rússia, a bacia hidrográfica do Volga compreende mais de 1,3 milhões de quilômetros quadrados. O rio que dá nome à bacia nasce no planalto de Valdai (na verdade um conjunto de colinas cuja altitude máxima não ultrapassa os 400 metros,) e deságua no mar Cáspio através de um grande delta após percorrer cerca de 3.700 km.
O caráter plano da imensa planície Russa, unidade morfológica drenada pelo Volga, permitiu que vários rios que correm nessa área (inclusive alguns não pertencentes à bacia), tivessem nascentes muito próximas uma das outras. Essa condição natural ensejou que, com alguma facilidade, as várias bacias independentes pudessem ser interligadas. Foi assim que, tendo o Volga como eixo principal, construíram-se barragens, eclusas e canais que resultaram numa densa rede fluvial que permitiu a plena navegação por cerca de 4000 km. de vias aquáticas.
Através do Volga e dos canais que o conectam com outros cursos fluviais da planície Russa pode-se atingir os mares Báltico, Branco, Cáspio, Azov e Negro. Todo o conjunto, denominado "Sistema dos Cinco Mares", é responsável pelo transporte de mais de 60% das cargas e cerca de 80% dos passageiros que usam as vias aquáticas da Rússia. Durante o inverno o sistema tem suas águas congeladas mas, devido a sua importância para a economia russa, frota de navios quebra-gelo mantém sua navegabilidade sem interrupção.
A construção e estruturação do Sistema dos Cinco Mares beneficiaram e valorizaram sobremaneira a posição da cidade de Moscou que, apesar de estar situada aproximadamente 700 km. do litoral mais próximo, se transformou no principal porto de todo o conjunto flúvio-marítimo.
Amplas áreas da bacia do Volga têm na indústria sua principal atividade econômica, com destaque para a indústria automobilística, cuja implantação inicial se verificou no final da década de 1920. Nos anos 1960, com a chegada da Fiat italiana implementou-se ainda mais este importante setor industrial da antiga União Soviética. Além da indústria automobilística, existem numerosas indústrias siderúrgicas, metalúrgicas e químicas. A falta de cuidado ambiental por parte de grande parte das indústrias instaladas às suas margens, transformou o Volga num rio com graves níveis de poluição que vêm afetando, há algumas décadas, as populações ribeirinhas chegando inclusive a prejudicar seriamente a tradicional pesca do esturjão, peixe que é encontrado no mar Cáspio, nas proximidades do delta do Volga.
Uma série de importantes cidades além de Moscou situa-se junto ao vale do Volga. Dentre elas destaca-se Stalingrado, nome antigo da atual cidade de Volgogrado, um centro urbano de grande significado histórico para o povo russo. Foi nessa cidade e em seus arredores que se travou, em 1942/43 a batalha de Stalingrado entre forças da Alemanha nazista e do exército da URSS. A batalha, vencida pelos soviéticos, mudou o curso da Segunda Guerra Mundial e desde então a cidade tornou-se um dos marcos simbólicos da tenacidade e patriotismo do povo russo.
Um mosaico étnico
A região do médio e baixo vale do Volga é atualmente foco de preocupações geopolíticas por parte de Moscou. Nessa área localizam-se seis das vinte e uma repúblicas autônomas da Federação Russa (Tchuvashia, Bashkortostão, república dos Maris, Mordóvia, Udmúrtia e Tartastão), todas elas conhecidas como repúblicas do Volga.
A região onde se localizam essas repúblicas é uma zona de encontro de povos fino-ugrianos (mordovinos, maris e udmurtes), de origem turca (tártaros, bashkires e tchuvashes) e russos. Há também uma significativa diversidade religiosa com a presença de cristãos ortodoxos e muçulmanos sunitas. Em algumas delas os indivíduos de origem russa representam a maioria da população como são os casos das repúblicas dos Maris (47%), Mordóvia (61%) e Udmúrtia (59%), enquanto nas outras eles são minorias expressivas, sempre acima de 25% do efetivo populacional total. No conjunto, o contingente populacional dessas seis repúblicas autônomas corresponde a mais ou menos 10% da população de toda a Federação Russa.
A maior dor de cabeça de Moscou na região está ligada às intenções políticas dessas repúblicas a respeito de sua participação no interior da Federação Russa. Há aquelas, como o Tartastão em que há fortes sentimentos de independência; outras, como Bashkortostão, estão engajadas num processo de maior autonomia, concretizada no fato de que muitas de suas leis prevalecem sobre aquelas da federação. Por fim, as outras não têm, até agora, colocado em questão sua condição de repúblicas componentes da Federação Russa.
A tentativa de separatismo da Chechênia, uma das repúblicas russas localizada na região do Cáucaso, fez muitos nacionalistas da região do Volga sonharem com a independência total de suas repúblicas em relação à Moscou. O governo russo não ousa sequer pensar no pesadelo geopolítico que derivaria dessa situação, justamente numa região que é considerada por muitos como o “coração de todas as Rússias”.
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