Vera Chaia
A mídia é neutra? Desde as eleições de 1989, a mídia brasileira exerce influência significativa nas disputas presidenciais. Agora, ela está escolhendo o seu candidato.
A cobertura que a mídia faz do processo eleitoral influencia a decisão do voto do eleitor. Será que esta cobertura é isenta, neutra e objetiva?
As eleições de 1989 podem ser consideradas um marco na política brasileira, porque foi exatamente neste período que se restabeleceram as eleições diretas para a Presidência da República no Brasil, após o regime militar e um longo período de transição. Mas aquele processo eleitoral foi marcado por uma cobertura extremamente tendenciosa, através de edições tendenciosas dos debates entre candidatos e com o apoio irrestrito por parte da mídia a uma determinada candidatura.
Toda a imprensa escrita, bem como a televisão e o rádio, destacaram o “fenômeno Collor” como algo novo na política brasileira, “comprando” a imagem de “caçador de marajás” de Collor e apresentando-o como o político que introduziria o Brasil no contexto internacional.
Todos os outros candidatos e, principalmente, o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, foram desqualificados pela mídia.
Collor foi eleito como resultado, em grande medida, deste trabalho executado pela mídia brasileira e coordenado pelas organizações Globo. Para que sua vitória se efetivasse, a equipe de Collor, corroborada pela cobertura da mídia, levantou acusações e calúnias contra Lula, envolvendo inclusive aspectos de sua vida pessoal.
Após dois anos e nove meses, o “sonho” das elites brasileiras se tornou um pesadelo e o “fenômeno Collor” foi destruído. A imprensa mudou sua posição e começou a atacar Collor (desmandos, corrupção, caixa dois). Os “caras pintadas” saíram às ruas exigindo a saída de Collor. O Congresso Nacional, depois de ouvir os “apelos populares” e também as “elites políticas”, resolveu abrir um processo contra Collor, o que resultou em seu impeachment (impedimento), em dezembro de 1992.
Quando Itamar Franco, o vice de Collor, assumiu a presidência as elites começaram a articular um novo plano para recuperação da hegemonia abalada.
Nesse contexto, o Plano Real, que visava controlar a inflação e promover a estabilização da moeda, foi implantado pelo então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso. Nas eleições presidenciais de 1994, o embate fundamental se deu entre FHC, do PSDB, que fez coligação com o PFL e parte do PMDB, contra Lula, do PT. Naquele processo eleitoral, a mídia escolheu FHC como seu candidato e “comprou” o slogan da campanha situacionista: “defenda o Plano Real”. O candidato do PT era considerado opositor ao plano de estabilidade e, segundo fontes governamentais e a propaganda eleitoral do candidato do PSDB, traria a volta da inflação ao Brasil.
No ano de 1998, novamente duas candidaturas presidenciais se destacaram: a do presidente FHC e de Lula. A campanha eleitoral foi totalmente centrada na idéia da continuidade. A mídia voltou suas baterias contra a noção de ruptura, associando-a sempre a valores negativos. A política desapareceu dos telejornais, virtualmente substituída pela propaganda, e os debates entre candidatos não se realizaram. FHC, na dianteira das pesquisas, se recusou a participar e as próprias emissoras de televisão não se interessaram em promovê-los.
A outra novidade das eleições de 1998, que favoreceu a candidatura de FHC, foi a permissão da reeleição, que demandou uma alteração constitucional. Na forma com que a alteração ocorreu, o presidente não precisava se desincompatibilizar do cargo para disputar a reeleição. Assim, FHC fez sua campanha eleitoral ocupando o cargo de presidente da República. A cobertura da mídia, afinada com a linha de campanha do candidato-presidente, misturou cuidadosamente os atos do governo à imagem do candidato, o que contribuiu para a vitória de FHC no primeiro turno No processo eleitoral atual, algumas pré-candidaturas estão definidas, mas ainda não homologadas pelos partidos e tampouco registradas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o que só ocorrerá em junho. No momento, as pesquisas destacam as candidaturas de José Serra, do PSDB, Lula, do PT, Anthony Garotinho, do PSB, e Ciro Gomes, do PPS.
A disputa eleitoral já começou. O seu primeiro lance de impacto foi a desestabilização da candidatura de Roseana Sarney, que tinha despontado nas pesquisas de opinião.
Acossada por um escândalo, posto a nu através de uma operação da Polícia Federal, a candidata do PFL desistiu da disputa. O PFL acusa o governo e o PSDB de estarem por trás da operação policial. Em tese, a desistência de Roseana favorece a candidatura situacionista de José Serra.
O candidato da situação desponta como o preferido das elites dominantes e da mídia. A dengue, que reapareceu com toda força em alguns estados brasileiros, foi analisada pela mídia como um problema dos governos estaduais e municipais. A culpa também foi lançada sobre a população, que não soube “limpar seus vasos de plantas e quintais”.
O Ministério da Saúde, cujo titular era o candidato do PSDB, foi poupado.
A cobertura da mídia, parcial e tendenciosa, tem o seu próprio contexto. Recentemente, numa operação espetacular de salvamento financeiro, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou um pacote de ajuda para a Globo Cabo. Os recursos públicos utilizados na operação podem ter sido decisivos para evitar um colapso financeiro das Organizações Globo. Desde o resgate da Globo Cabo, presenciamos mudanças na cobertura jornalística das Organizações Globo.
Boletim Mundo Ano 10 n° 3
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