terça-feira, 29 de março de 2011

SIVAM, OS OLHOS E OUVIDOS DO ESTADO NA ERA DA INFORMAÇÃO

Nos séculos  XVII e XVIII, os fortes portugueses desenharam os esboços da Amazônia brasileira. Hoje, uma rede de radares, sensores e computadores esquadrinha a “última fronteira”
Exatamente às 13 horas do último dia 25 de julho, o presidente Fernando Henrique Cardoso inaugurou oficialmente o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam). O sistema, cuja estrutura posta em funcionamento corresponde a três quartos do total planejado, integrará ao Brasil, de forma mais efetiva, cerca de 5,5 milhões de km2 – uma superfície equivalente à metade da Europa.
A Amazônia sempre esteve no núcleo do imaginário nacional. Quando o hino louva o “gigante pela própria natureza, deitado eternamente em berço esplêndido”, refere-se ao menos parcialmente à imensa Amazônia e suas riquezas. De forma menos ufanista, a Amazônia tem sido descrita e analisada como região periférica de um país periférico, vazio demográfico, fronteira demográfica, fronteira de recursos, espaço de conflitos, inferno verde, paraíso em chamas.
O potencial de riquezas, reais ou imaginárias, da Amazônia estimulou, desde muito cedo, os projetos de controle e ocupação do espaço da bacia amazônica.
As primeiras iniciativas remontam à época colonial. Em 1616 a Coroa portuguesa fundou o Forte do Presépio de Belém. A fortificação que deu origem à atual capital paraense funcionava como sinal de posse e localizava-se em terras de Portugal, porém muito próximas ao Meridiano de Tordesilhas.
Nessa época, contudo, o trono português pertencia a Filipe II de Espanha. A União Ibérica, que durou entre 1580 e 1640, tornava anacrônica a divisão do Novo Mundo inscrita no Tratado de Tordesilhas.
Aproveitando-se dessa circunstância, os portugueses organizaram expedições que implantaram fortes ao longo do Amazonas e junto aos seus afluentes, em terras situadas muito a ocidente do Meridiano de Tordesilhas.
Paralelamente, a administração colonial estimulou o estabelecimento de diversas ordens religiosas na Amazônia.
As ordens religiosas constituíram o sustentáculo da ocupação colonial da região.
Em 1750, o Tratado de Madri substituía o de Tordesilhas. O novo tratado, logo depois contestado pela Coroa espanhola, confirmava o controle português sobre a maior parte da atual Amazônia brasileira. A transferência da capital do Estado do Grão-Pará, de São Luís para Belém, em 1751, e a criação da capitania de São José do Rio Negro, com capital em Manaus, em 1774, engendraram o edifício territorial do domínio português sobre a região.
Durante a época colonial, a Amazônia portuguesa manteve ligações econômicas quase que exclusivamente com a Europa, exportando as chamadas “drogas do sertão”.
Nesse período, a ocupação do território amazônico ficou restrita às várzeas do rio principal e de alguns de seus afluentes. Foram junto aos fortes e às missões religiosas que surgiram os primeiros povoados e vilas.
O Estado nacional brasileiro voltou-se para o problema da integração da Amazônia só em meados do século XX. O projeto estratégico estava associado à “marcha para o Oeste” lançada por Getúlio Vargas  nos anos 30 e acelerada pela transferência da capital federal para Brasília. Nesse contexto, foram criados os órgãos de planejamento regional: a Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia (SPVEA), transformada depois na Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), o Banco da Amazônia (Basa) e a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa).
O projeto de integração envolveu a implantação de uma infra-estrutura viária e energética e propiciou a compra subsidiada de glebas de terras por parte de empresários nacionais e estrangeiros. Além disso, empresas estatais se associaram a transnacionais  para conduzir a exploração de recursos minerais. O Programa Grande Carajás, no Pará e Maranhão, representou o ponto mais alto dessa estratégia de valorização da “fronteira de recursos”.
A decisão de implantação do Sivam, no início da década de 90, reflete um novo estágio do empreendimento de integração regional, ligado à revolução tecno- científica.
O fundamento geopolítico da decisão encontra-se no caráter internacional do espaço amazônico.
O Brasil possui pouco menos de 70% da chamada Amazônia Internacional. Outros sete Estados soberanos – Guiana, Suriname,Venezuela, Colômbia, Peru, Equador e Bolívia – e a Guiana Francesa possuem terras amazônicas. A extensa linha de fronteiras amazônicas do Brasil – as “fronteiras mortas”, fracamente povoadas  acabaram se transformando numa espécie de terra de ninguém. O contrabando de armas, o narcotráfico, o garimpo descontrolado em reservas indígenas e a extração ilegal de madeira são elementos da paisagem geopolítica e econômica da faixa de fronteiras.
Estima-se que, atualmente, mais de 1,5 mil vôos por ano cruzem os céus da Amazônia brasileira fora do controle das autoridades. Calcula-se que cerca de 90% desses vôos sejam clandestinos, participando de operações de contrabando e comércio de drogas e armas. Os dados obtidos pelo Sivam deveriam possibilitar ações voltadas contra o crime organizado. Além da vigilância do tráfego aéreo, o Sivam fiscalizará desmatamentos, queimadas e outras formas de agressões ambientais. Os equipamentos do sistema permitirão também fazer prospecções no subsolo da área recoberta por florestas, ajudando a localizar jazidas minerais.
O sistema é constituído por uma rede de grande sofisticação tecnológica formada por dezenas de aviões, meia dúzia de satélites, 25 radares, 87 estações de recepção de imagens e 200 plataformas de coleta de dados nos rios. Os nós da rede são os Centros Regionais de Vigilância (CRV), situados em Porto Velho, Manaus e Belém e conectados ao centro principal, em Brasília.
Boletim Mundo Ano 10 n° 5

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