sábado, 5 de março de 2011

Diário de Viagem- BEN JOHNSON, O IDEAL OLÍMPICO

Osmar de Oliveira*
Foi-se o tempo em que os atletas competiam com suas próprias forças, com suas heranças genéticas e, vá lá, com mínimas doses de sorte tão típicas das competições esportivas. Até o final da década de 70, os médicos afirmavam que o atleta campeão era 90% genética e 10% a combinação de treinamento, alimentação, determinação psicológica e uma pequena ajuda da sorte, do vento e do material esportivo.
Esses percentuais mudaram muito. A herança cromossômica é a mesma através dos tempos, mas não tem cotação maior que 70%. A alimentação já é diferente para um velocista e para um lançador, para uma ginasta e para um nadador. A determinação psicológica é regulada por técnicas rigorosas de neuro lingüística e até de hipnose. A fisiologia chega ao requinte de determinar as alterações metabólicas em cada tipo de esforço. A medicina esportiva já é capaz de reduzir em mais da metade o tempo de recuperação das lesões. Aí, chegou a vez do dinheiro para fazer supercampeões correrem atrás de patrocínios tão rentáveis que deixam para trás as dores mais lancinantes. Depois, malditamente chegou a “droga”, o doping para abreviar o tempo de chegada e também o tempo da vida. Agora, já na Austrália, chegaram as roupas especiais de tecidos cibernéticos que driblam a água e o vento.
Na década de 80, o uso de drogas começou a tomar conta do esporte, com escândalos sucessivos, principalmente no atletismo, natação, ciclismo, levantamento de peso e futebol. As estimulantes anfetaminas já não satisfaziam os atletas que buscaram nos esteróides anabólicos (derivados da testosterona, o hormônio masculino) a fonte para a quebra de recordes acima das capacidades físicas naturais. Os médicos responsáveis pelas leis que controlavam o doping não imaginavam que os atletas pudessem estar usando essas drogas tão perigosas e de múltiplos efeitos colaterais, que vão até a morte (e aconteceram inúmeras, decorrentes  do uso dos esteróides). Enquanto os Laboratórios pesquisavam técnicas de detecção dessas substâncias na urina dos atletas, eles foram se empanturrando delas, ficando milionários e doentes ao mesmo tempo.
Quando os exames toxicológicos ficaram mais especializados, alguns monstros sagrados do esporte passaram a ser expostos ao ridículo e ao descrédito público. O caso mais importante foi o do canadense Ben Johnson nas Olimpíadas de Seul, em 1988. Claro que seu recorde mundial de 1987 fora conseguido com o uso dessas bombas, sob a supervisão do médico Mario Astafhan, que ludibriava os controles de dopagem, mas hoje está afastado dos estádios esportivos. Ben Johnson voou baixo em Seul (9,83 segundos nos 100 metros), virou recordista e dois dias depois teve que devolver sua medalha, foi suspenso e humilhado. Quando tentou voltar às pistas, sem o uso das drogas, foi um fiasco muito grande e acabou ultrapassado até por estudantes que corriam por prazer e não pelo dinheiro. Pasmem: ainda arrumou uma boquinha de preparador físico particular do argentino Maradona. Outro fiasco: Maradona tropeçou na cocaína, não ganhou mais nada e Ben voltou para o Canadá Mas o que leva os atletas a cometerem essa loucura?
No começo, era para melhorar a performance e chegar em primeiro lugar. Agora, é por necessidade mesmo, porque quem não usa só chega do segundo lugar para trás.
Salvam-se ainda os atletas dos esportes coletivos como o basquetebol, o voleibol, o futebol e desportistas de modalidades em que o ganho de massa muscular não é interessante.
Do ponto de vista médico, é incompreensível que alguém use esses produtos para aumentar tanto a massa muscular e, portanto, a Força, mas cujas contrapartidas abrangem agressividade, atrofia do testículo, do pênis, diminuição da produção de espermatozóides, queda de pelos e cabelos, afinamento da voz, câncer de fígado, lesões na próstata, facilidade de enfartar o coração, prejuízo na função renal e até a morte.
Dinheiro compra a saúde
Há pouco, eu indaguei de um atleta americano que nitidamente havia se drogado com esteróides por que fazia aquilo. Ele respondeu: “Doutor, depois que fui campeão, ganhei US$ 10 milhões e agora vou gastar só US$ 1 milhão para os médicos curarem os efeitos colaterais que a droga me deixou”. Pobre rapaz que ainda pensa que os médicos são onipotentes e podem curar tudo...
Nesta última década, acuados pelos rigores dos exames de laboratório e pelas suspensões que lhes foram impostas, os atletas começaram a buscar outros recursos tão vergonhosos quanto maléficos. Descobriram que o hormônio de crescimento pode fazer efeito quase parecido ao esteróide.
Sabem que podem virar diabéticos e ter deformidades nos pés e nas mãos, mas não estão ligando para isso. Descobriram também a eritropoietina, um hormônio fabricado pelo rim e capaz de aumentar a resistência para as provas longas do atletismo e do ciclismo.
Os uniformes e equipamentos de alta tecnologia que estréiam nos Jogos de Sydney não são doping. Mas são uma covardia. Os maiôs inteiriços, que imitam a pele de tubarão e oferecem resistência à água menor que a própria pele humana, vão tornar as braçadas mais rápidas e os recordes devem cair.
Mas se surgir um super atleta no Djibuti ou no Equador, ele não poderá ganhar de um australiano, alemão ou americano vestido com essas peles deslizantes. No ciclismo, os países mais ricos desenham bicicletas especiais, adaptadas à altura do ciclista, ao tamanho de seus braços, ao comprimento de suas pernas, e ainda por cima cobrem sua cabeça com capacetes de acrílico que furam o ar para aumentar a velocidade.
Quem está ganhando medalhas agora não pode ter o mesmo orgulho daqueles vencedores de trinta anos atrás, porque não são genuínos. São bons, é verdade, mas ajudados pela tecnologia e infelizmente, muitas vezes, pela droga. Ultrapassam os limites dos poderes humanos deixando para trás uma multidão de jovens que querem competir limpamente. A vantagem é só financeira e isso não é pouco. Mas deve ficar aquele sentimento de que “não ganhei por mim mesmo” e isso não é bom para o espírito. E fica ainda a preocupação de que, em poucos anos, as tecnologias farmacêuticas e têxteis vão produzir outros campeões não genéticos e os campeões de hoje serão esquecidos. É a lei do mais forte, num campo em que deveria imperar a lei do mais limpo.
A década dos recordes
No passado recente, os recordes custavam a cair. Era um sinal de que estavam sendo alcançados os limites da velocidade, força e resistência do ser humano.
Mas o espetáculo globalizado do esporte é movido por recordes. Nas duas últimas décadas, eles começaram a cair com freqüência impressionante. O exemplo mais evidente é fornecido pela “prova das provas”: os 100 metros rasos . O célebre recorde de Jim Hines, conseguido nos Jogos da Cidade do México, em 1968, e considerado imbatível à época, perdurou 15 anos. O novo recorde de Calvin Smith ainda durou oito anos. Na década de 90, depois de Carl Lewis, o recorde é quebrado a intervalos de dois ou três anos. Como a biologia do ser humano não mudou, há algo de “misterioso” no fenômeno...
Boletim Mundo Ano 8 n° 6

Um comentário:

  1. gostei do seu site prof por enquanto nao deu p le pq to só de passagem...outro dia vou ler tudo..xau bjs.

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