quarta-feira, 9 de março de 2011

DRAGÃO OU TIGRE DE PAPEL?

Em duas décadas, o PIB chinês ultrapassará o dos Estados Unidos essa profecia, construída por economistas e políticos conservadores, alimenta a fobia anti-chinesa no Ocidente
O tamanho da economia chinesa vai superar o da economia americana nos próximos 20 anos? Os cenários construídos por economistas e políticos conservadores norte-americanos dizem que vai. A fobia de um futuro dominado pela China não é gratuita  alimenta fantasias e orçamentos militares na maior potência do planeta.
Um dos principais economistas que pinta o retrato nessa perspectiva é Angus Maddison, que publicou uma verdadeira Bíblia das grandiosas perspectivas chinesas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Por outro lado, é grande o número de economistas no mundo inteiro que continuam apostando contra a economia chinesa. Em especial, ainda existem temores de que a China faça uma desvalorização cambial, antes de aderir à Organização Mundial do Comércio (OMC).
Como a China conseguiria se transformar na economia-líder do século XXI? A grande chance chinesa repousa sobre dois pilares: dimensão do mercado interno e cautela na exposição aos capitais externos. Os capitais estrangeiros que lá aportaram buscam o posicionamento para explorar o fabuloso potencial do mercado interno. E muito desse investimento é resultado dos interesses da enorme comunidade chinesa que está fora do país.
Angus Maddison ressalta fatores de longo prazo. Até o início do século XIX, a China era a maior economia do planeta.Trata-se de uma sociedade que, ademais, teve existência como unidade política e econômica anterior a outros países cuja modernidade é normalmente associada ao surgimento de um Estado nacional.
Maddison estima ainda que mesmo na hipótese de o crescimento econômico chinês cair a uma taxa de 5,5% ao ano, o PIB do país ficaria em pé de igualdade com o dos EUA em 2015. No momento em que a economia chinesa atingisse a dimensão da norte-americana, o PIB de cada um dos países representaria 17% do PIB mundial. Evidentemente, em função da enorme disparidade demográfica, o PIB per capita chinês continuaria muito inferior ao americano.
Ao longo do processo de reformas econômicas, deflagrado em 1978, a indústria de pequeno porte tem sido uma força importante na redefinição do mercado interno chinês. O tamanho médio da empresa não-estatal na China caiu de 112 para oito funcionários por empresa. O desempenho exportador da China, de outro lado, teve como alavanca uma desvalorização cambial que reduziu o valor da moeda, em 1997, a um quinto do que era em 1980. Entre 1978 e 1995, o PIB per capita cresceu 6% ao ano, menos apenas que a taxa registrada pela Coréia do Sul e seis vezes superior à média mundial.
A participação do PIB chinês na economia global passou de 5% para 10%.
O grande desafio chinês nos próximos anos será fazer um desmonte o menos traumático possível do sistema produtivo estatal, com mais de cem mil empresas e operando com muita capacidade ociosa, absorvendo mais de 70% do crédito doméstico e com um grau de inadimplência que contamina 20% dos balanços de bancos. Há também desafios cruciais no setor agrícola. A China alimenta 22% da população mundial com 7% do total da terra agricultável do planeta.
A demanda por comida (em boa medida, importada) será um dos principais condutos de influência da China sobre o resto do mundo nas próximas décadas. Especialistas da OCDE estimaram que as importações chinesas de grãos chegarão, no ano 2000, a 40 milhões de toneladas. Mas ainda há muito a se fazer em termos de técnicas de gerenciamento de produção agrícola, irrigação, políticas oficias de crédito e subsídios.
Há algo que coloca seriamente em risco as perspectivas de crescimento econômico da China as tensões sociais internas. A renda da população rural, estimada em quase 70% do total de habitantes do país, caiu 10% nos últimos dois anos, aumentando a já imensa desigualdade entre a China rural e a China urbana. A renda da população urbana cresce sem parar e representa, agora, 70% da renda total.
Mesmo nessa moldura de desigualdades crescentes, a China foi o país que apresentou a maior redução nos índices de pobreza entre 1990 e 1998, segundo relatório assinado pelos presidentes do FMI, do Banco Mundial, da ONU e da OCDE. Nesse período, o número de pobres na China diminuiu de 360 milhões para 210 milhões (uma redução de 42%). No mundo, no mesmo período, a redução foi de 1,3 bilhão para 1,2 bilhão de pessoas (cerca de 8%).
Mas um país com má distribuição de renda está exposto a tensões sociais que costumam atuar como obstáculos políticos às decisões de investimento e financiamento.
Ou seja, não basta um mercado interno grande: ele precisa ser crescente e sustentável. Disso dependerá o papel da China no próximo século.
O segundo PIB do mundo?
Nesse início de século XXI, enquanto o mundo inteiro patina ou entra em recessão, a economia chinesa registrou, no primeiro trimestre de 2001, um crescimento anual de espantosos 8,1%. A meta oficial é de uma taxa de crescimento do PIB de 7%.
As visões que colocam a China como a grande potência econômica do século XXI gostam de utilizar um método de cálculo do PIB com base na paridade do poder de compra (PPC). De acordo com esse método, o PIB chinês é o segundo maior do mundo, à frente do Japão (veja o gráfico). Segundo o método tradicional, que converte os preços internos para dólares de acordo com a taxa média de câmbio dos três anos anteriores, o PIB chinês é o sétimo, atrás dos Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Grã-Bretanha e Itália.
Usando esse método de cálculo, as moedas são convertidas entre si a uma taxa que torna iguais os poderes de compra os diferentes países. O método é uma forma de descontar do cálculo as taxas de inflação e as flutuações da taxa de câmbio em cada país.
O exemplo mais famoso desse tipo de cálculo é o “índice Big Mac”, publicado pela revista The Economist. Comparase o preço de um Big Mac nos vários países. Como se trata de um produto praticamente igual em todas as partes do mundo, chega-se à taxa de câmbio simplesmente através das razões entre os preços. Se o sanduíche custa X francos na França e Y dólares nos EUA, a PPC no caso é simplesmente X/Y.
A vantagem desse método de cálculo é que o PIB de um país em relação aos outros fica menos dependente de fatores de curto prazo, principalmente de instabilidades financeiras e monetárias. Quando o PIB de vários países é convertido a uma moeda comum usando-se a PPC, é como se todos estivessem sendo calculados a partir de um mesmo sistema de preços.
O Brasil serve de exemplo das diferenças de método no cálculo do PIB. Segundo o cálculo tradicional, o PIB brasileiro sofreu um retrocesso com a violenta desvalorização do real, em janeiro de 1999. Usando-se a PPC, não houve retrocesso do PIB, pois embora tenham perdido bastante poder de compra de produtos importados, os brasileiros não perderam poder de compra dos produtos nacionais.
Boletim Mundo Ano 9 n° 3

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