Nelson Bacic Olic
Os conflitos que vêm ensangüentando Angola nas últimas décadas iniciaram-se em 1961. Até 1974, tiveram caráter anti colonial, opondo os movimentos de libertação ao domínio português. Desde a independência, em 1975, o que ocorre é uma guerra civil entre o governo angolano oriundo do principal movimento anti colonial, o Movimento Popular pela Libertação de Angola (MPLA) e a guerrilha da União Nacional para a Independência Total de Angola (Unita), liderada por Jonas Savimbi.
Localizada na porção sudoeste da África, Angola abrange duas áreas geograficamente distintas. Uma delas é a planície costeira, disposta no sentido norte-sul, com largura que não excede 250km. Ali concentra-se a maior parte da população, especialmente em torno das cidades de Luanda, a capital, Lobito e Benguela .
A outra parcela corresponde às regiões interiores, localizadas sobre um amplo planalto que cobre a maior parte do território e cujas altitudes variam entre 1.000 e 2.000 metros. Pouco povoada, abriga populações que, em grande medida, se dedicam à agricultura. A distinção geográfica entre essas duas áreas ensejou uma oposição cultural entre litoral e interior e entre cidade e campo.
Essa dicotomia alcançou toda a sua expressão durante a colonização portuguesa. Os postos de trabalho administrativos e militares gerados pela colonização, assim como as escolas e a língua portuguesa, exerceram influência sobre a etnia quimbundo das regiões litorâneas e, especialmente, sobre a população de mestiços “assimilados” de Luanda, que configurou uma elite angolana intelectualizada. As populações da etnia ovimbundo, concentradas nos platôs interiores do centro e do sul, permaneceram à margem da modernização colonial. A clivagem étnica e geográfica acentuou-se após a independência. O MPLA, que chegou ao poder, estruturou-se originalmente entre mestiços “assimilados” e quimbundos. Por outro lado, a Unita encontrou bases sociais na população de etnia ovimbundo, majoritária no país.
Entre 1975 e o início da década de 90, a guerra civil angolana transitou pela estrada da ideologia. No contexto da Guerra Fria, o MPLA, de orientação marxista, era apoiado pela União Soviética e chegou a receber a ajuda de tropas cubanas, enquanto a Unita era sustentada pelos Estados Unidos e pela África do Sul do apartheid.
O fim da Guerra Fria provocou a “reciclagem” política do MPLA e a transferência do apoio diplomático americano para o governo de Luanda.
A Unita perdeu também seu pilar geopolítico regional, desde o fim do regime do apartheid na África do Sul.
Desprovida de tinturas ideológicas, a guerra civil foi turbinada pelos interesses econômicos conflitantes das elites que comandam os exércitos rivais. O MPLA controla as rendas da exportação de petróleo. A Unita pilota o contrabando de diamantes.
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África.
O produto responde por cerca de 90% das exportações oficiais do país. Cerca de dois terços da produção é obtida no enclave de Cabinda, que tem pouco mais de 7 mil km2 e localiza-se a 60 quilômetros da fronteira setentrional do país, entre os dois “Congos”. Angola também está entre os cinco maiores produtores mundiais de diamantes. A extração ocorre principalmente no nordeste do país, em área que, há anos, permanece em poder da Unita.
Há uma década, a guerra civil angolana tornou-se uma disputa entre elites que parasitam os recursos naturais do subsolo. A unidade política do país representaria, para os dois lados, a perda das rendas de monopólio minerais. A alternativa é a “guerra eterna”, essa fonte de fortunas para duas camarilhas, que espalha mortos e mutilados no país com maior densidade de minas terrestres em todo o mundo.
Boletim Mundo Ano 8 n° 5
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