Guerra é a ponta do iceberg da disputa de interesses entre Moscou e Washington pelo controle das riquezas da região.
Washington acusa Moscou de adotar uma política ‘‘imperialista’’ contra a Chechênia. William Safire, um dos principais porta-vozes dessa linha de acusação, diz que a guerra traduziu ‘‘a velha vontade imperialista russa de dominar as fontes e as linhas de abastecimento de petróleo e gás iranianos e da bacia do mar Cáspio, e, com isso, garantir uma influência forte sobre a vida econômica de seus adversários.”
Isso é incontestável. Só que Safire não contou toda a história.
Os cinco países da bacia do Cáspio - Azerbaijão, Cazaquistão, Irã, Rússia e Turcomenistão - possuem reservas estimadas em 200 bilhões de barris de petróleo e um volume comparável de gás. Apenas Azerbaijão, Cazaquistão e Turcomenistão contêm mais petróleo e gás do que o Golfo. As cinco maiores empresas petrolíferas americanas (Chevron, Conoco, Texaco, Mobil Oil e Unocal) concluíram ou estão concluindo acordos com esses países (exceto o Irã) para explorar suas reservas.
Não por acaso, em 1992, o senador americano Robert Dole declarou que as “preocupações” dos Estados Unidos quanto às reservas de petróleo e gás mundial haviam se ampliado da região do Golfo “rumo ao norte, incluindo o Cáucaso, o Cazaquistão e a Sibéria”. E cinco anos depois, o senador Sam Brownback fez aprovar uma nova resolução, conhecida como “Estratégia da Rota da Seda”, segundo a qual os Estados Unidos deveriam “ampliar a sua presença” na bacia do Cáspio.
Mas mesmo isso ainda é só parte da história. Em 1992, o Pentágono adotou uma resolução, o Defense Planning Guidance (Guia de Planejamento de Defesa), que estabelece, como um de seus objetivos centrais, “neutralizar” e “impedir o renascimento” da rival Rússia. Isso tinha, como conseqüência, “ampliar a presença” americana na ex-URSS, nos Bálcãs e no antigo Leste europeu.
É a perspectiva defendida por Zbigniew Brzezinski, ex-chefe do Conselho de Segurança dos Estados Unidos.
Brzezinski explicita três razões para “neutralizar” a Rússia: é o país que liga a Europa à Ásia, é dona de vastos recursos naturais e, sendo instável do ponto de vista político, pode permitir que novos movimentos comunistas ou nacionalistas tomem o poder, assim como provar-se incapaz de conter a “expansão islâmica”.
A “conquista da Eurásia” é a pedra angular de sua estratégia. “Cerca de 75% da população mundial vive na Eurásia, que possui a maior parte dos recursos naturais do planeta... Ali estão 60% do PIB do planeta e cerca de 75% das reservas conhecidas de energia... Depois dos EUA, as outras seis maiores economias e os seis maiores investidores em armas estão localizados na Eurásia. Todos os poderes nucleares, exceto um, estão ali localizados." (ZB, "The Grand Chessboard: American Primacy and its Geostrategic Imperativs", NY, Basic Books, 1997).Esses são os interesses do "imperialismo russo", mas também a causa da intervenção não menos "imperialista" dos Estados Unidos nos Bálcãs (em particular, durante a Guerra de Kosovo) através da Otan. Se a Chechênia está causando tal comoção, é apenas por estar situada sobre um dos principais oleodutos que ligam a Rússia ao mar Negro, passando pelo Bósforo, na Turquia, e chegando ao mar Mediterrâneo.
Boletim Mundo Ano 8 n° 1
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