No final de julho, foi realizada em Ushuaia, sul da Patagônia argentina, mais uma conferência de presidentes do Mercosul. Além dos quatro chefes de Estado, participaram os do Chile e da Bolívia, países com laços especiais com o Mercosul, e um convidado extraordinário: Nelson Mandela, presidente da África do Sul. Ali, o território do Mercosul foi declarado “zona de paz”. A declaração assume duplo compromisso renegar o uso da força para resolver litígios e evitar a corrida armamentista regional. A presença de Mandela sugere que o conceito de zona de paz poderá vir a ser estendido ao cone sul do Atlântico e, talvez, mais amplamente, a todo o Atlântico Sul.
Localizado entre o Trópico de Câncer e a Antártida, o Atlântico Sul é atravessado, de norte a sul, por uma imensa cadeia submarina. Seus pontos mais elevados correspondem a ilhas oceânicas ao sul da linha do Equador (Santa Helena, Tristão da Cunha, Martim Vaz, Fernando de Noronha e Malvinas). Outro arco forma as ilhas do mar do Caribe (Grandes e Pequenas Antilhas).
A presença de inúmeras correntes marinhas, tanto frias (do Atlântico Sul e Benguela) como quentes (do Brasil, Sul-Equatorial e das Guianas), favoreceu a proliferação do fitoplâncton, propiciando o adensamento dos cardumes e a exploração da atividade pesqueira. Em vários pontos da plataforma continental, de ambos os lados do Atlântico Sul, foram localizadas expressivas jazidas de petróleo, como na Nigéria, no Gabão e no Brasil.
Em decorrência do tipo de colonização a que foram submetidos os países dos dois continentes e da retilinidade do litoral (especialmente o africano), a navegação de cabotagem é pouco desenvolvida.
Contudo, o Atlântico Sul é cruzado pela importante rota comercial do Cabo. Os navios que a utilizam são, principalmente, super petroleiros que, por seu calado, não podem transpor o Canal de Suez, necessitando contornar a África para escoar o petróleo extraído na área do Golfo Pérsico.
Entre a segunda metade da década de 70 e o final dos anos 80, a porção meridional do Atlântico Sul assumiu os contornos de uma zona de tensões. A geopolítica regional, naquele período, caracterizou-se por inúmeros focos de instabilidade. Em Angola, implantou-se um governo comunista, com apoio diplomático da União Soviética e proteção militar de tropas cubanas. Na Namíbia, sob controle da África do Sul, eclodia a luta pela independência. Na África do Sul, acirrava-se o combate ao apartheid.
No Cone Sul da América, imperavam ditaduras militares.
Temendo o aumento da influência soviética na região, a partir de Angola, Washington chegou a propor, sem sucesso, o estabelecimento de um pacto militar, abrangendo Brasil, Argentina, Uruguai e África do Sul. Na mesma época, Argentina e Chile quase foram à guerra pela posse de ilhas no canal de Beagle. Em 1982, explodiu a Guerra das Malvinas, entre argentinos e britânicos.
O fim da Guerra Fria e do regime marxista em Angola, a desintegração do apartheid e a implantação de regimes democráticos nos países do Cone Sul da América transformaram a paisagem geopolítica do Atlântico Sul. É nesse novo contexto que se encaixa a Declaração de Ushuaia.
Boletim Mundo Ano 6 n° 5
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