terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Acordo Histórico na Irlanda do Norte- IRA troca Terrorismo por Argumentos

Cessar-fogo no Ulster muda cenário de violência criado pela ocupação britânica e transforma o ETA basco no último bastião do terror europeu.
Vinte e cinco anos depois do desembarque das tropas britânicas, a Irlanda do Norte deixa de ser o principal cenário de guerra na Europa Ocidental.
O comunicado do IRA (Exército Republicano Irlandês) de 31 de agosto, anunciando a “suspensão completa” da luta armada pela independência, representa um novo começo no velho conflito entre católicos e protestantes.
A presença britânica na Irlanda tem oito séculos, pontilhados pela resistência tenaz mais infrutífera dos irlandeses. A Reforma Protestante na Inglaterra, liderada por Henrique VIII (1509-1547) agravou o conflito, adicionando a poção religiosa ao caldo explosivo da opressão nacional. O desembarque das forças de Oliver Cromwell, em 1641, deflagrou o longo processo de desnacionalização das províncias do norte da ilha (Ulster): os soldados receberam terras irlandesas, antecipando o intenso movimento migratório de protestantes britânicos expulsos pela dissolução das aldeias feudais na Inglaterra.
A população católica, sujeita à perseguição, deslocou-se em massa para a América do Norte, configurando um nítido grupo nacional no melting pot dos Estados unidos. Desde o século XIX, os protestantes tornaram-se maioria no Ulster.
O domínio britânico foi formalizado em 1801, com a incorporação da Irlanda à Grã-Bretanha através da constituição do Reino Unido.
A Guerra Anglo-Irlandesa de 1918-21 foi encerrada com o Ireland Act. A Irlanda do Sul (Eire), de ampla maioria católica, ganhou o estatuto de Estado Livre, vindo a proclamar a república e a independência em 1949. O Ulster permaneceu sob o domínio da Coroa, com autonomia limitada no  interior do Reino Unido. Na década de 60, os católicos da Irlanda do Norte encheram as ruas de Belfast e Londonderry pedindo o fim da legislação eleitoral discriminatória oriunda dos antigos regulamentos da Ordem de Orange. As tropas de ocupação britânicas, solicitadas pelo governo protestante de Belfast, chegaram em abril de 1969. Começava a saga do IRA.
O IRA nasceu na guerra de 1918. Nos anos sessenta, participou do movimento pacífico pelos direitos civis.
Depois do Domingo Sangrento de Belfast, a 30 de janeiro de 1972, quando soldados britânicos abriram fogo contra um protesto de rua, transformou-se na mais temida organização terrorista européia.
Até o Eire, que defende a reunificação irlandesa e não participa da Otan, afastou-se do IRA. Há um ano, o tabuleiro irlandês voltou a se mexer. Jornais ingleses noticiaram contatos secretos entre o Sinn Fein (braço político do IRA) e o governo de Londres.
Em dezembro de 1993, o Reino Unido e o Eire emitiram uma Declaração propondo negociações cobre o Ulster e condicionando a participação do IRA ao abandono da luta armada.
A Declaração Anglo-Irlandesa e o comunicado do IRA formam um trampolim para o desconhecido.
O tabuleiro é complexo. Londres condiciona a hipótese de reunificação irlandesa a um plebiscito no Ulster, onde os protestantes representam 54% do 1,6 milhão de habitantes. O Eire (e o IRA) não podem aceitar uma consulta que não inclua os 3,5 milhões de irlandeses do sul (93% católicos). Os protestantes do Ulster, eleitores do partido Unionista, têm lideranças como o reverendo Ian Paysley, que rejeitam a própria idéia de negociações com o IRA. Mas circuito autofágico da violência e da repressão foi rompido. Se é verdade que a guerra é a continuação da política por outros meios, o inverso pode, às vezes, ser falso: britânicos e irlandeses, protestantes e católicos, não podem  mais fugir do mundo dos argumentos.
* Das 3.169 pessoas mortas nos 25 anos de conflito, mais de 2 mil eram civis.
* Na Irlanda do Norte, cercas de arame farpado e guaritas do Exército britânico separam os bairros católicos dos protestantes.
*A Grã-Bretanha mantém 18 mil soldados na província;os gastos sociais provocados pelo conflito somam US$ 6 bilhões anuais

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