sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Autoridade Palestina em crise - “Falcões” judeus e palestinos ameaçam criar impasse regional

Demora do governo israelense em cumprir os acordos de setembro de 1993, entre Israel e a OLP, joga lenha na fogueira dos radicais dos dois lados; Iasser Arafat, presidente da Autoridade Palestina, enfrenta pressões políticas agravadas pelo desemprego e miséria em Gaza e Jericó.
Newton Carlos
A Autoridade Palestina (AP) deveria cobrir toda Cisjordânia desde julho de 1994, depois de instalada em maio em Gaza e Jericó, não fossem protelações sucessivas no cumprimento de dispositivos da declaração assinada em setembro de 1993 pela Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e o governo de Israel. Mas só em agosto deste ano, com vigência prevista para setembro, foram negociadas algumas das questões envolvendo dois pontos cardeais: a retirada do Exército israelense e eleição do Conselho de Autogoverno Palestino.
Já se sabe que parte da área rural da Cisjordânia continuará ocupada, enquanto 140 mil colonos judeus espalhados entre quase 500 cidades e aldeias palestinas se mostram dispostos a impedir que os acordos de paz sejam totalmente implementados  antes de novembro de 1996, quando haverá eleições em Israel.
Esperança de que os trabalhistas sejam substituídos no poder e a direita triunfante promova um recuo geral. Mesmo que analistas como Hirsh Goodman, do “Jerusalém Post’’, jornal anti trabalhista, digam que o acordo “é irreversível’’, ou que Moss Maoz, da Universidade Hebraica de Jerusalém, garanta que “o sonho de um Grande Israel está agonizante’’, a idéia de resistência não descansa. Há casos de colonos que buscaram terras e moradias mais baratas. A maioria, no entanto, é de sionistas religiosos convencidos de que pisam a terra bíblica de Israel e isso lhes dá direitos sagrados, não revogáveis pelos homens. A OLP repete a todo momento, em negociações difíceis, que eles não podem beneficiar-se de status extra-territoriais e seus bolsões terão de submeter-se a leis palestinas.
Com Israel colocando a segurança acima de tudo, e a OLP batendo na tecla de que a essência dos acordos é a troca de terras pela paz, Iasser Arafat enfrenta dificuldades em duas frentes: na mesa de negociações e “internamente’’. As comemorações de maio em Gaza mostraram que os palestinos estavam, no mínimo, desapontados com o “primeiro ano de paz’’. Desemprego de 60% e nível de vida 10 vezes abaixo do dos israelenses. A Cisjordânia, mais próspera (15 vezes maior do que Gaza e população 10 vezes menor), ajudaria a mudar o quadro, mas a extensão da Autoridade Palestina continua emperrada. Vinte mil policiais palestinos em dois enclaves (Gaza e Jericó) que, somados, mal dão 300 km2, produzem a imagem de um Arafat submetido às pressões israelenses de segurança.
Em maio deste ano, a AP criou uma Corte de Segurança, e logo condenou a 15 anos de prisão um militante do Jihad Islâmico (guerra santa) acusado de executar atentado em Israel. Como o premiê Rabin insiste em que a AP “não faz o suficiente para combater o terror anti-Israel’’, o El Qods, principal jornal árabe de Jerusalém leste, escreveu que “a policia palestina passou a ser responsável pela segurança de cada israelense, mesmo que ele viva em Israel”. O Davar, um dos maiores sindicatos israelenses, ligado aos trabalhistas, disse que ‘‘embora a maioria dos atentados terroristas não venha de Gaza, mas dos territórios ocupados por nós, Rabin quer que Arafat faça verdadeira guerra contra os palestinos, convencido de que só assim será extirpado o extremismo islâmico’’.
Apesar disso, tanto no Hamas, cujos esquadrões fundamentais são tidos pura e simplesmente como terroristas, como no  Jihad Islâmico existem correntes “jovens e pragmáticas’’, egressas da Intifada, dispostas a participar das eleições e ocupar um lugar no futuro quadro político. O Hamas é o segundo em peso, depois do Fatah, a organização de Arafat. O primeiro sinal de distensão apareceu a 18 de maio, quando o Jihad admitiu que “a AP é uma realidade’’ e se dispôs ao diálogo para “evitar o espectro da divisão’’.
No Hamas e no Jihad acirrou-se o debate entre falcões e pombas. Mesmo para estas, no entanto, não se deve abandonar a luta armada, “dimensão fundamental das doutrinas do Hamas e do Jihad e meio de combate eficiente às condições draconianas impostas aos palestinos’’. Mas admitem acomodações. A Palestina com as fronteiras do antigo mandato britânico poderia ficar para depois. Que os palestinos ganhem direitos imediatos e totais sobre Gaza e Cisjordânia. Constatações, como as feitas pelo Centro Palestino de Estudos e Pesquisas de Nablus, ajudam a arrefecer impulsos fundamentalistas. O Fatah aparece com 49% de apoio entre palestinos, o Hamas com 12,4% e o Jihad com 2,1%. Acontece que o próprio Arafat sabe que o demorado cumprimento dos acordos de paz funciona como elemento corrosivo, inclusive em seu movimento, onde três grupos dissidentes, conhecidos como os “Abus’’, vão em frente, dialogam entre si e formulam estratégias  de assédio ao dirigente máximo da OLP e “presidente’’ da AP, dupla função não aceita por muitos dirigentes palestinos de primeira linha. Para um dos “Abus’’, com o controle do maior campo palestino no Líbano, Arafat não passa de traidor o Gaza é bomba-relógio que “explodirá na casa do quisling da AP’’.
No ano passado as últimas forças leais a Arafat no Líbano tentaram tomar o campo de Ain Hilweth e não conseguiram.
Ele é o quartel general do Munir Mikdah, auto proclamado guardião do principio básico do Fatah, a “total libertação, só possível por meio de luta armada’’. Os outros dois “Abus “ são menos radicais, acham que Arafat ainda não ultrapassou o ponto de não-retorno e haveria tempo de “resgatálo’’.
Os três se encontraram em junho em Beirute, enquanto surgia novo grupo de oposição, a “Coalizão Nacional”, na qual pontifica um dos decanos da resistência palestina, Shafig al-Hout.
Embora Arafat seja “irreformável’’,não existe alternativa à OLP, admite ele.
Mas como resgatá-la, pergunta, se ela é refém de Arafat em Gaza? “Um meio seria forçá-lo a escolher entre a chefia da AP ou a liderança da OLP’’, acrescenta. Talvez se concentrem aí as maiores pressões sobre Arafat, favorecidas pelas protelações intermináveis na aplicação dos acordos de paz.
Boletim Mundo Ano 3 n °5

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