terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O Impacto das Reformas Estruturais- Marchas contra Desemprego e o Arrocho anunciam o fim das Ilusões de Riqueza

Argentina, Chile e México começam a sentir com força os efeitos de uma pobreza crescente, em oposição à euforia inicial criada pelos “ajustes” e integração ao Nafta; Peru e Venezuela vivem à sombra.
NEWTON CARLOS
Os “ajustes econômicos” na Argentina e Chile enfrentam seus primeiros protestos populares. Na Argentina, a partir de violentas manifestações em Santiago Del Estero, em dezembro, várias províncias registraram atos de reação ao empobrecimento.
A Marcha sobre Buenos Aires, juntando colunas que partiram do norte e do sul do país, foi coordenada por sindicatos à margem da oficialista Confederação Geral do Trabalho, com apoio da esquerda à direita (a esquerdista Frente Grande, que cresce nas cotações eleitorais, o movimento  pela Dignidade e Independência, do ex-coronel “cara pintada” Aldo Rico, e a   anti peronista União Cívica Radical).
A ONU e a Igreja constatam que mais ou menos 1/3 da população vive hoje abaixo da linha de pobreza. “A festa acabou”, escreveu um jornal de Buenos Aires. As medidas do “ajuste” baixaram para entre 30% e 35% a participação dos salários na renda nacional, contra 48% anteriores. Desemprego oficial de 11% e o não oficial de 17%. A reeleição de Menem, possível com mudanças na Constituição, já não parece garantida.
No Chile, o recém-empossado presidente Eduardo Frei é obrigado a lidar com pesquisas mostrando que os chilenos, antes preocupados principalmente com direitos humanos, agora querem redução da pobreza, empregos e melhorias dos salários e dos serviços de saúde pública. A pobreza afeta de modo brutal 1/3 dos 14 milhões de chilenos.
Na Venezuela, o governo foi obrigado a colocar o sistema bancário, os preços e o câmbio sob controle estatal para acabar com a farra especulativa que sugou quase US$ 5 bilhões dos cofres oficiais, já com déficit equivalente a 15% do PIB. O octogenário Rafael Caldera elegeu-se prometendo medidas de “compensação social” para a dureza do “ajuste” do governo anterior (queda de 44% para 35% da participação dos salários na renda nacional, do presidente Andrez Perez, alvo de duas tentativas de golpe, hoje na cadeia à espera de julgamento por corrupção). Caldera também se beneficiou da imagem de honestidade e suas medidas de emergência econômica, vistas como “luta contra os especuladores”, conseguiram amplo apoio popular. Mas Hugo Chaves, coronel que encabeçou o fracassado golpe em fevereiro de 1992 e perdoado por Caldera, depois de deixar a prisão disse que haverá golpe “caso a Venezuela não sofra transformações”.
No México, pela primeira vez depois de seis anos levantam-se críticas ao rígido monetarismo, assediado pelo fantasma do crescimento inferior a 1% este ano. O México já acumula em 1994 déficit comercial de US$ 5 bilhões e o Nafta, saudado como tábua de salvação, se revela instrumento de sucção, com as exportações dos EUA reinando.
Desde a revolta indígena de Chiapas (janeiro), a fuga de dólares alcança US$ 11 bilhões, com produção industrial em declínio e o desemprego em alta. No poder desde 1928, o Partido Revolucionário Institucional provavelmente terá de recorrer à fraude para vencer as eleições de agosto.
No Peru, 15 milhões dos 22 milhões de peruanos, estão abaixo da linha de pobreza, 7 milhões em miséria geral. Metade dos que saem das universidades não consegue emprego.
A popularidade de Fujimori, que se deve sobretudo à bem sucedida repressão ao Sendero Luminoso, começa a derrapar. O ex-secretário geral da ONU, Perez de Cuellar, é um forte adversário nas eleições de 1995.
Para o ex-ministro da economia chilena, Alejandro Foxley, a desigualdade de renda é a diferença entre os tigres asiáticos e latino-americanos.
Na Ásia, os 50% mais ricos têm entre 5 e 10 vezes mais do que os pobres.
No Chile 12, Argentina 15 e México 27. Por isso os “ajustes” não conseguem consenso social e são derrotados eleitoralmente. Já o foram na Venezuela, Honduras e Colômbia.
 EUA reativam  escola de ditadores
Volta à cena um dos mais nebulosos instrumentos da Guerra Fria em nosso continente, a School of the Américas, também conhecida como “escola dos ditadores”.
Fechada em 1984, por exigência do governo panamenho, quando funcionava num quartel do Comando Sul dos Estados Unidos, na Zona do Canal do Panamá, ela foi reaberta em Fort Benning (Geórgia).
Não se sabe exatamente em que época estas aulas começaram e quanto já somam os diplomas dados, de doutores fardados em antiguerrilha. A Counterpunch, publicação do Institute for Policy Studies, de Washington, fala de 56 mil desde 1946.
Informações anteriores davam conta de 80 mil de 22 países da América Latina, a partir de 1963. Entre os agraciados figuram o general Pinochet, Banzer e Galtieri, ex-ditadores do Chile, Bolívia e Argentina. Também o general panamenho Noriega, hoje preso nos EUA, cujas tropas invadiram o Panamá para agarrá-lo e condená-lo como traficante de drogas.
O fechamento da School, determinado pelo Panamá com base nos acordos de devolução da Zona do Canal, foi anunciado quando era preparado no Pentágono mais um programa com gastos de US$ 6 milhões. Estavam matriculados 2.618 novos alunos. O país da América Central com maior presença foi a Nicarágua sob a ditadura de Anastácio Somoza (1/3 do total).
Em seu novo lar, na Geórgia, a School adotou treinamento envolvendo direitos humanos. Mas de forma no mínimo curiosa. Como parte das questões práticas, os alunos são colocados diante de múltiplas escolhas. Se, por exemplo, o chefe de seu pelotão mandar cortar orelhas de soldados inimigos mortos como provas do número de baixas, o que deve ser feito? As alternativas oferecidas são: obedecer a ordem , mas comunicando aos superiores; simplesmente desobedecer, ou mandar que outros, de patentes mais baixas, obedeçam. E assim por diante, se devem ou não ser destruídos hospitais usados pelo inimigo como abrigo, fuzilados ou não moradores de cidades que à noite fazem guerrilha ou o que fazer com  inimigos capturados portadores de informações valiosas.
Newton Carlos é comentarista da rede Bandeirantes, da equipe de analistas da Folha de S. Paulo e edita o jornal Vermelho e Branco. É autor de Camelot, uma Guerra Americana (ed. Objetiva, Rio, 1991), entre outros.

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