Para além da inevitável e ufanista retórica sobre a amizade entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, o Mercosul criará oficialmente uma zona de livre comércio entre esses países, a partir de 1º de janeiro de 1995.
Serão removidas, na data, as barreiras ao fluxo de mercadorias.
Mas essa etapa ainda não caracteriza um mercado livre, já que não faltam obstáculos à plena circulação de capitais, bens e serviços.
Os principais obstáculos podem ser agrupados em três vertentes, definidas pelas distintas políticas cambiais (a forma pela qual cada país lida com suas taxas de inflação, recessão, desemprego etc., o que inclui os famosos “reajustes estruturais”, como o Plano Real ou o Plano Cavallo), políticas alfandegárias (o grau de protecionismo e subsídios do Estado às exportações que cada país pretende garantir aos seus produtores, e que dificulta uma Tarifa Externa Comum) e políticas de defesa do consumidor (o conjunto das normas de padrão de qualidade exigidos na produção dos produtos, que se reflete no seu preço final).
O Mercosul tem a seu favor o fato de que as trocas comerciais entre os países-membros vêm crescendo de maneira extraordinária. Em 1980, as exportações brasileiras para a Argentina, Uruguai e Paraguai mal atingiam os US$ 2 bilhões, e as importações não chegavam à metade disso.
Em 1992, o comércio total entre o Brasil e o Mercosul atingiu US$ 6,33 bilhões.
O que impulsionou esse movimento – e só isso explica o seu eventual êxito – não é nem a vontade política nem a competência de qualquer dos chefes de Estado do Mercosul. É a nova realidade mundial, que liquidou os dois grandes blocos da Guerra Fria, e criou um irresistível processo de formação de blocos regionais (o Nafta, na América do Norte, a União Européia e o definido pelo Japão e Tigres Asiáticos).
O Mercosul é uma resposta “natural” a esse quadro, imposta pelas necessidades de articulação geopolítica e de defesa geoeconômica de seus participantes.
Não por acaso, o Chile, que vinha resistindo ao Mercosul (seu ex-presidente, Patrício Aylwin, preferia flertar com o Nafta), ensaia com Eduardo Frei, um movimento de aproximação.
Mas não há nada que justifique projeções ufanistas de um grande futuro. Há muitos interesses contraditórios em jogo, complicados por relações tradicionalmente conflitas (por exemplo, a surda competição entre o Brasil e Argentina pela liderança na região) e pela histórica relação de subordinação estratégica aos Estados Unidos, que tem seus próprios planos para a América Latina. Em qualquer hipótese, o Mercosul é já uma realidade, e jogará um certo papel no concerto das nações.
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