domingo, 23 de janeiro de 2011

Urubus entre Girassóis

Não se pode confundir a canção Tropicália, de Caetano Veloso, como o disco-manifesto Tropicália ou Panis et circensis, que conta com a participação de vários artistas e tem como canção-manifesto Geléia Geral, de Gilberto Gil e Torquato Neto: “é bumbaiê-iê-iê”. Tropicália,a canção, não está no disco homônimo, mas poder ser entendida também como manifesto do movimento.
Caetano deixa bem clara sua forma de construção poética a partir de colagens em que misturam urbano e rural, rico e pobre, vida e morte, bangüê-bangue e tamborim. O movimento pretendia “devorar” todas as influências, retirar-lhes os escalpos, colocar tudo no liquidificador e servir em bandeja um suco cujo gosto, embora estranho a principio, ainda é bem familiar.
As inúmeras citações, que mesclam times antagônicos – a música de protesto (“o fino da bossa”) e a Jovem Guarda (“que tudo mais vá pro inferno) – vão resultar no maior exemplo de música e estética brasileira for export: Carmem Miranda. A repetição da última sílaba de seu nome é ainda uma referência ao dadaísmo, um movimento crítico e irreverente, surgido na Europa nos anos 10 e que procurava dissolver a arte no cotidiano. Para os dadaístas, qualquer objeto – um guarda-chuva, um penico ou até mesmo um quadro – poderia ser considerado obra de arte. O importante não era o objeto, mas o gesto, o momento singular que o transformava em algo “especial”. A “dessacralização da arte” também influenciou a geração de 22.
Mas deixemos com Caetano uma avaliação do que foi o tropicalismo, em depoimento a Heloísa B. de Hollanda, no livro Cultura e participação nos anos 60 (Brasiliense, SP, 1981): “O tropicalismo teve grandeza não só porque arrombou a festa ou porque falou do arcaico e do moderno (…) A gente fez essa coisa com grandeza, colocando em xeque a pequenez dessa elite colonial que é a sociedade brasileira, uma nação que não é ainda inteiriça, que não acontece, onde as coisas não rolam e as pessoas não têm acesso a nada”.
Wellington Borges Costa Seção Papo Cabeça Tudo muda / o tempo todo / no mundo Lulu Santos (1955

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