Os grupos étnicos hutus (90% da população) e tutsis (quase 10%) disputam o poder, e produzindo um conflito herdado do período colonial.
Nos últimos meses, uma feroz guerra entre hutus e tutsis deixou um trágico saldo em Ruanda, até há bem pouco conhecida como a terra dos últimos gorilas da África: 1 milhão de mortos, 2,5 milhões de refugiados, milhares de feridos e epidemias como cólera e tifo. As causas do conflito – recordista em número de vítimas – refletem o processo de colonização do país e as especificidades de sua política interna. Localizada nos altos planaltos da África oriental, Ruanda é do tamanho de Alagoas, com uma população de 7,5 milhões, formada por hutus (90%), e tutsis (quase 10%). Os hutus são originários da Bacia do Congo e se estabeleceram primeiro em Ruanda. No século XV foram dominados pelos tutsis, originários das regiões próximas à Etiópia.
O Congresso de Berlim (1885) destinou Ruanda aos alemães, que dominaram o país até a Primeira Guerra (1914/18), quando a área foi cedida à Bélgica. Os belgas permitiram, em geral, que os tutsi mantivessem o poder. Em 1959, acreditando que o rei tutsi pretendia a independência, a monarquia foi abolida e os hutus passaram a controlar a política interna. A mudança estimulou perseguições de tutsis. Muitos fugiram para países vizinhos, especialmente Uganda. Em 1962, o país tornou-se independente.
Em 1973, Juvenal Habiarimana instaurou sua ditadura. Desde então, a política interna passou a três componentes: o partido do governo, formado só por hutus, a oposição “legal” de hutus, e a Frente Patriótica Ruandesa (FPR), de tutsis exilados em Uganda.
Em outubro de 1990, depois de várias tentativas frustradas, grupos da FPR – formados pelos filhos dos que fugiram de Ruanda nos anos 50 – invadiram o norte do país, reclamando o direito de retorno. De 1990 a 93 Ruanda viveu uma guerra civil intermitente, que parecia se resolver com a assinatura dos Acordos de Arusha, na Tanzânia (agosto de 1993). Mas, a demora de Habiariama em cumprir os acordos agravou a situação. A guerra explodiu no início de abril, quando o seu avião foi derrubado por um míssil. Embora sem provas, os tutsis da FPR foram acusados. Hutus começaram a matar tutsis e os hutus da oposição.
A FPR inicia, então, uma ofensiva que culminaria com a tomada do país três meses depois.
Os massacres praticados pelo governo e o avanço da FPR ocasionaram um êxodo gigantesco em direção ao oeste, para a fronteira do Zaire. A comunidade internacional só depois de muita vacilação e de centenas de milhares de vítimas definiu uma intervenção humanitária, efetuada inicialmente por 1.200 soldados franceses.
Esses soldados tinham como objetivo proteger os civis e se interpor entre as forças em luta. A intervenção que durou dois meses (de junho a agosto), criou uma zona de segurança no sudoeste do país (v. o mapa). A FPR venceu a guerra, formou um novo governo com a participação de hutus “moderados” que têm apelado para que os refugiados voltem às suas casas e ajudem reconstruir a Ruanda. Mas esses refugiados parecem achar mais seguro correr o risco da fome e epidemias.
Super natalidade reflete miséria africana
Na América Latina e na Ásia, explosão demográfica é coisa do passado. As curvas de crescimento populacional, que registraram taxas anuais ao redor de 3% há três décadas, cederam sob o impacto da modernização econômica.
A pobreza perdura, mas a natalidade declina com a urbanização e a dissolução da unidade familiar de produção. A transição demográfica marcha na direção de um crescimento populacional inferior a 2% ao ano.
A África desafia a lei da transição demográfica.
Nos países do leste africano, Golfo da Guiné e Sahel encontram-se taxas de incremento populacional de 3,5% (Quênia e Níger), 3,3% (Uganda e Costa do Marfim) e 3,1% (Malavi, Mali e Togo), só comparáveis às de certos países islâmicos. Na África não é o tradicionalismo religioso que sustenta a natalidade explosiva, mas a miséria.
Não é essa a causa essencial da tragédia africana.
O continente foi integrado à economia mundial de maneira perversa, ao longo dos séculos.
O tráfico negreiro, entre os séculos XVI e XIX, drenou a população em idade produtiva, freou o aumento populacional e criou conflitos etno-tribais que ainda perduram. A colonização européia inventou fronteiras artificiais, agravou rivalidades regionais e gerou elites tribais autocráticas, que até hoje controlam os aparelhos de Estado. Nas últimas três décadas, a concorrência entre americanos e europeus no mercado mundial de alimentos sabotou o desenvolvimento da agricultura africana e dissolveu as estruturas comunitárias rurais.
A miséria africana alimenta a natalidade descontrolada, que compensa com sobras as catástrofes humanas provocadas pela fome, guerras tribais e disseminação de epidemias (entre elas, a AIDS). A natalidade explosiva reforça o círculo vicioso da miséria, esculpindo pirâmides etárias achatadas, que refletem o predomínio numérico das crianças: na Quênia, Uganda e Ruanda 49% da população tem menos que 15 anos.
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