terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Conferência da ONU sobre População Mundial- Relação entre explosão demográfica, pobreza e ecologia divide Especialistas

Neomalthusianos querem controlar a natalidade nos países pobres, para inibir crescimento vegetativo e liberar recursos em investimentos produtivos; outras correntes criticam os ricos, que somam 20% da população, mas consomem a maior parte dos recursos naturais e são responsáveis por 80% da poluição.
REGINA ARAÚJO
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo tem 5,5 bilhões de habitantes. A cada ano, 95 milhões somam-se a este contingente, a esmagadora maioria nascidos na Ásia, África e América Latina. Estes números e suas implicações pra o futuro da humanidade foram o centro da Conferência Internacional sobre a População e Desenvolvimento (CIPD), que reuniu 20 mil estudiosos no Cairo entre 5 e 13 de setembro.
A CIPD foi a terceira conferência da ONU sobre o tema, e a primeira com o objetivo de explicar as correlações entre população e desenvolvimento.
A população do mundo cresce de forma extremamente desigual. Países desenvolvidos apresentam índices de incremento demográfico baixos ou negativos, economias mais pobres convivem com taxas de crescimento superiores a 3% ao ano, projetando a duplicação do número de habitantes em menos de 25 anos. Assim, a associação simplista entre elevado incremento populacional e subdesenvolvimento é tentadora.
Para muitos, o alto crescimento demográfico é uma das principais causas da generalização da pobreza em vastas regiões subdesenvolvidas.
A miséria seria resultante… da própria miséria. O aumento descontrolado do número de pessoas atrapalharia o desenvolvimento dos Estados pobres, desviando recursos para investimentos não produtivos e criando uma relação desfavorável entre o número de pessoas em idade de trabalhar e o total de habitantes. O controle de natalidade seria o passaporte para o desenvolvimento.
Muitas vezes, essa forma de enxergar a dinâmica demográfica aparece com conotação “verde”, na voz dos que alertam para os riscos ambientais da “explosão” demográfica. Os ecomalthusianos exercem influência crescente na opinião pública, ancorados na força do movimento ambientalista mundial. Segundo eles, o rápido crescimento demográfico se traduziria em pressão sobre os recursos naturais – em especial nos ecossistemas tropicais e equatoriais – e em sério fator de risco para o futuro. O controle da natalidade seria uma forma de preservar o patrimônio ambiental.
Em muitas áreas ecologicamente frágeis, o crescimento demográfico implica sérias pressões sobre o meio ambiente. Em algumas regiões dos trópicos semi-áridos – o Sahel africano é o exemplo mais tristemente famoso – o rápido incremento populacional tem como resultado a sedentarização dos rebanhos e a superutilização das terras férteis, implicando em rápida perda de fertilidade e em crises agudas de fome. Entretanto, o padrão de produção e consumo dos países  ricos, cuja população parou de crescer, têm impactos ainda mais dramáticos sobre o meio ambiente.
Os países desenvolvidos representam cerca de 20% da população mundial, mas consomem a maior fatia dos recursos naturais disponíveis e são responsáveis por 80% da poluição do planeta.
Os neomalthusianos enfrentaram na CIPD a oposição dos representantes do Vaticano e dos países muçulmanos, contrário aos métodos anticoncepcionais, e principalmente, ao aborto.
Mas a discussão entre neomalthusianos e religiosos oculta as grandes transformações recentes na dinâmica demográfica mundial. Apesar dos dogmas religiosos,e, em muitos casos, da ineficiência dos programas de planejamento familiar, as regiões subdesenvolvidas (à exceção da África subsaariana e África do Leste) diminuíram suas taxas de incremento demográfico nas duas últimas décadas. Atualmente, a América Latina e a Ásia meridional ocupam uma posição intermediária, entre as taxas explosivas da África e a estagnação demográfica européia e norte-americana .
A modernização e a crescente urbanização imprimem novas características ao comportamento reprodutivo dos países pobres ao romperem com a unidade familiar de trabalho, na qual todos os membros da família participam juntos do processo produtivo.
Em breve, o alto incremento demográfico vai deixar de ser característica comum ao mundo subdesenvolvido. Será circunscrito aos países marcados pela permanência do grupo familiar no meio rural e pela manutenção de um regime coletivo de trabalho.
REGINA ARAÚJO
Regina Araújo é co-autora com Demétrio Magnoli, da coleção A Nova Geografia e de Geografia, Paisagem e Território (Ed. Moderna)

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