sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O Século do Crime- Máfia movimentam US$ 750 Bi

Pela primeira vez em tempos de relativa paz, a ONU realizou duas conferências  em Nápoles (novembro de 1994) e Cairo (maio de 1995)- em menos de cinco meses para tratar de um mesmo assunto: o crime internacional organizado. A ONU concluiu que as máfias, baseadas em 23 países, faturam, por ano, US$ 750 bilhões, ou 1,5 Produto Interno Bruto (PIB, soma total das riquezas produzidas) do Brasil. O seu principal motor seriam os US$ 200 bilhões gerados pelos cartéis do narcotráfico.
A soma tem grande impacto no mercado financeiro, especialmente quando as novas tecnologias e as leis permitem a movimentação de grandes somas com um simples apertar de botão de computador.
Se esse capital fosse subitamente retirado de circulação, bancos e bolsas de valores iriam à falência, assim como importantes cidades (como Miami, Boston e Los Angeles) e os ‘‘paraísos financeiros’’. Países como a Colômbia teriam que declarar sua inadimplência.
As principais máfias são a Cosa Nostra americana e siciliana, os cartéis colombianos, as máfias da Rússia, a Yakuza japonesa e as Tríades de Hong Kong, Taiwan e sudeste asiático. Controlam um vasto espectro de atividades, da produção e tráfico de drogas ao contrabando de armas, tecnologia e material usado na produção de mísseis nucleares, passando pela venda de órgãos humanos e comércio de crianças e escravas brancas. A Rússia é o país onde se faz mais visível a sua atividade. Segundo o Ministério do Interior russo, em 1994 atuavam no país 3.500 grupos mafiosos, que controlavam 35% dos 2.300 bancos comerciais e 2 mil empresas que fornecem serviços ao setor público.
O impacto do dinheiro do crime sobre as economias nacionais é facilmente visível no caso dos ‘‘paraísos financeiros’’.
Ali, as instituições bancárias não indagam a origem do dinheiro, e  garantem o seu reinvestimento em indústrias, bolsas de valores e todo tipo de comércio legal. Esse processo, “lavagem de dinheiro sujo”, alimenta uma parcela crescente da economia formal. O Panamá, por exemplo, tornou-se ‘‘paraíso financeiro’’ após uma lei de sigilo bancário de 1970. Em alguns meses, 74 bancos (eram cinco, em 1960) captaram US$ 11 bilhões em depósitos. Outros “paraísos” são as ilhas Virgens (britânicas), as ilhas de Jersey, Guernsey e Sark, no Canal da Mancha, as Antilhas holandesas, as ilhas Caimã, Bahamas, Bermudas, Malta,Chipre, Mônaco, Liechtenstein, Suíça, Gilbratar, Hong Kong e Cingapura.
As máfias têm muito maior liqüidez e eficácia que suas concorrentes no mercado financeiro bancos e empresas legais.
Não têm que prestar contas a acionistas, nem preocupações éticas com o Tesouro público, e lançam mão de qualquer expediente para conquistar vantagens. Seus lucros legais tendem a se multiplicar rapidamente, de tal forma que os negócios de fachada dão aparência ‘‘limpa’’ a impérios clandestinos.
Os governos decidiram adotar medidas preventivas à “lavagem” de dólares.
Por exemplo, fiscalizar contas que atinjam determinada soma -em geral, US$ 10 mil, checar a origem do dinheiro empregado em grandes investimentos (como os imobiliários),ou verificar se fulano ganhou, de fato, na loteria, ou se teve a “ajuda” de “deus”, como no caso de deputados brasileiros que alegam ter vínculos com o Criador.
Mas esses métodos são de eficácia questionável, quando se trata das grandes finanças. Talvez detectem o pequeno meliante, mas não os ‘‘chefões’’ são os políticos que fazem ou controlam a aplicação das leis.
A tradição de sigilo que cerca os negócios financeiros favorece o florescimento dos vínculos entre máfias e bancos. É, obviamente, raro que os bancos permitam o “vazamento” de dados estabelecendo sua conexão com o crime. Uma dessas ocasiões aconteceu em abril de 1991. O banqueiro saudita Gaith Pharaon, à época um dos quinze homens mais ricos do mundo, declarou, em Buenos Aires, que todos os grandes bancos lavam narcodólares, incluindo os tradicionais, como o First Bank of Boston e o Crédit Suisse. Pharaon se ressentia de que apenas o seu Bank of Credit and Commerce International, estopim de um escândalo em 1992, era citado por seus vínculos com a máfia.
No Brasil, é impossível calcular com exatidão o impacto do dinheiro “sujo” no mercado formal. Uma das razões foi explicitada  pelo escândalo Collor-PC Farias: o governo não controla as atividades bancárias, já que, como se viu, é muito fácil abrir contas ‘‘fantasmas”, tendo como titulares pessoas de nome e CGCs falsos.
O descontrole foi agravado pelas leis aprovadas no início de 1992 pelo então presidente Cadente Collor, permitindo que capitais estrangeiros comprassem títulos e ações nas bolsas do país. Em julho de 1992, os investimentos estrangeiros ultrapassavam os US$ 0,5 bilhão mensais. É improvável que as autoridades conheçam a origem real desse dinheiro.
A crescente facilidade para a movimentação de capitais é uma necessidade imposta pela globalização da economia segundo a lógica neoliberal. É impossível entender as atuais dimensões do crime sem levar em conta as tendências do mercado global, e a infra estrutura tecnológica que as viabiliza. Ora, um componente fundamental da globalização é o crescimento do capital especulativo. Os jogos financeiros colocam em circulação eletrônica (via computador) bilhões de dólares que, em ‘‘economês’’, formam “capital fictício” –dinheiro que não tem correspondência nem em ouro nem em bens materiais. As corporações jogam com esse capital como se à mesa de pôquer: blefam, apostam, arriscam.
É muito tênue, nesse nível, a fronteira entre procedimentos legais e os mafiosos.
É um tipo de ambiente que favorece a proliferação de criminosos. Favorece, por exemplo, as jogadas envolvendo receptação de “dinheiro sujo” e seu reinvestimento  em ações e títulos legais. O mais grave, do ponto de vista do equilíbrio político mundial, é o fato de que as máfias adquiriram o poder de desestabilizar economias inteiras, mediante o puro jogo especulativo. Essa hipótese foi demonstrada, por exemplo, durante a crise do México, em que a fuga de grandes capitais em algumas horas levou o pânico ao mercado . De certa forma, este é o preço que o neoliberalismo paga pelo divórcio que promove entre o capital e o seu significado social.    
Boletim Mundo Ano 3 n° 5                                 

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