Contagem da População do IBGE antecipa tendências demográficas do novo século e já reflete algumas conseqüências da globalização
A população brasileira atingiu 157,1 milhões em 1996 e cresceu, nos últimos anos, a uma taxa média anual de apenas 1,38%. A intensidade das migrações inter-regionais atenuou-se, com a redução dos fluxos de sulistas e nordestinos para a Amazônia e das transferências de nordestinos para o Sudeste. Em compensação, são intensas as migrações intrarregionais, que agora dirigem-se menos para as metrópoles e mais para as cidades médias.
Essas informações foram obtidas pela Contagem da População, divulgada pelo IBGE há poucos meses, com data de referência de 1º de agosto de 1996.
Elas revelam o delineamento de uma nova dinâmica demográfica no Brasil da virada do século.
O Brasil está completando a etapa derradeira da sua transição demográfica.
O modelo teórico da transição demográfica exprime o intervalo entre dois padrões contrastantes de crescimento populacional. O primeiro, típico de sociedades pré-urbanas, caracteriza-se por elevadas taxas de natalidade e de mortalidade. O segundo, típico de sociedades urbanas, caracteriza-se por baixas taxas de natalidade e de mortalidade. O intervalo entre eles - ou seja, a transição demográfica divide-se em duas etapas: inicialmente,decrescem as taxas de mortalidade; em seguida, decrescem as taxas de natalidade.
A transferência da população do meio rural para o meio urbano e a concomitante desagregação da unidade familiar de produção é o motor escondido da transição demográfica.
Entre 1890 e 1940, a população do país cresceu a taxas de cerca de 1,8% ao ano. O censo de 1950 revelou um salto do crescimento vegetativo anual para quase 2,4%. A queda da mortalidade continuou, empurrando o incremento demográfico anual para perto de 3%. Essa foi a etapa inicial da transição. Na década de 70, começou a etapa derradeira, impulsionada pelo ritmo alucinante da urbanização brasileira.
As indicações disponíveis sugerem que o crescimento vegetativo estará em torno de 1,2% ao ano na virada do século . Depois de provocar a redução da mortalidade, através da difusão do sanitarismo e da vacinação infantil, a urbanização derrubou as taxas de natalidade, pela integração das mulheres ao mercado de trabalho e pelo aumento das despesas familiares com a criação dos filhos.
A pirâmide etária do país reflete, no estrangulamento da sua base, o novo estágio demográfico. Em 1991, a idade mediana - aquela que divide a população em dois blocos exatamente iguais - era de 21,7 anos. Em 1996, a idade mediana dos brasileiros atingiu 23,2 anos. O envelhecimento da população resultou na ampliação da parcela em idade potencialmente ativa (15 a 64 anos) e dos idosos, com redução da participação dos jovens
Teoricamente, a ampliação da parcela de adultos tem efeitos sócio econômicos positivos, em função da diminuição do peso proporcional dos gastos destinados à população não ativa (jovens e idosos). Mas essa é uma conclusão apressada. No caso brasileiro, a parcela de jovens é mais elevada justamente nas regiões geográficas e camadas sociais carentes, que registram crescimento vegetativo superior à média (embora em declínio). No lado oposto do espectro etário, o aumento da proporção de idosos implica pressões maiores sobre o sistema previdenciário, cuja crise continua a se aprofundar. Além disso, o crescimento da parcela da população ativa não significa aumento dos efetivamente empregados.
Nas condições postas pela globalização e pela revolução tecnológica, o número elevado de adultos pode significar mais subemprego e exclusão social.
A atenuação das migrações interregionais manifestou-se, diferenciadamente, por todo o país. A Região Sul, que havia registrado 510 mil emigrantes entre 1986 e 1991, gerou menos de 290 mil entre 1991 e 1996. A redução deve-se, em grande parte, à maior retenção de população pelo estado do Paraná. A Região Nordeste também registrou menos emigrantes e observaram-se inclusive fluxos de retorno de nordestinos que residiam no estado de São Paulo. Mesmo assim, 836 mil pessoas deixaram a região em direção ao Sudeste, e outras 380 mil deslocaram-se para o Centro-Oeste e o Norte. Os estados de Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul experimentaram ritmos de crescimento menores que os anteriores, em função da redução dos fluxos migratórios. Por outro lado, Tocantins, Pará, Amapá e Goiás (principalmente o eixo Goiânia-Brasília) tornaram-se importantes áreas receptoras de migrantes.
Se, em escala nacional, reduziu-se a mobilidade da população, fenômeno diferente ocorreu em escala regional.
A dinâmica das migrações intrarregionais estruturou-se em torno da continuidade do êxodo rural e do deslocamento de populações dos pequenos núcleos urbanos para as cidades médias. A taxa de urbanização, que era de 75,6% em 1991, atingiu 78,4%, um índice próximo ao de diversos países desenvolvidos. Nesse período, 1,8 milhão de pessoas deixaram o meio rural.
A maior parte desse êxodo ocorreu no Nordeste: 1,1 milhão.
Mas o padrão de urbanização se modificou. As regiões metropolitanas (classificação que agora inclui a Grande Vitória) cresceram a um ritmo de 2,25% nos anos 80. Nos anos 90, passaram a crescer a taxas médias de apenas 1,53%. Em compensação, ampliou-se o ritmo de crescimento das cidades médias - os chamados centros sub metropolitanos e capitais regionais - que receberam migrantes oriundos do meio rural, dos pequenos núcleos urbanos e mesmo das metrópoles.
Essa tendência está associada à nova geografia dos investimentos produtivos, que fogem das metrópoles em função dos altos custos de terrenos e impostos e das deseconomias provocadas pelo adensamento excessivo. Em certos casos, o deslocamento dos investimentos representa uma reação contra o sindicalismo militante enraizado nas aglomerações industriais tradicionais.
O lado positivo da nova tendência encontra-se na redução das pressões sobre as infra-estruturas físicas (terrenos, habitações, vias de transporte) e os serviços sociais de saúde e educação das metrópoles.
Quase 3 milhões de crianças fora das escolas
A Contagem da População revelou a lentidão do progresso educacional do país. Embora a escolarização tenha aumentado paulatinamente, alcançando hoje cerca de 90% das crianças entre 7 e 14 anos, mais de 2,7 milhões delas continuam fora das escolas. O dado positivo é o crescimento acentuado das matrículas na pré-escola, que atingiu 55,4% das crianças entre 4 e 6 anos, refletindo a maior incorporação das mulheres ao mercado de trabalho. No Nordeste, a mais pobre das regiões do país, a pré-escola matriculou 58,6% do grupo etário, índice só inferior ao do Sudeste (58,8%). Esse resultado atesta a eficácia de algumas políticas sociais aplicadas em estados da região.
No grupo etário entre 15 e 17 anos, a taxa de escolarização passou a se expandir mais velozmente, mas ainda não atingiu os 70%. Essa taxa continua baixa, se comparada aos países desenvolvidos e, inclusive, às chamadas “economias emergentes” asiáticas, gerando desvantagens para o Brasil, numa época em que a instrução e qualificação da mão-de-obra tornaram-se cruciais para a atração de investimentos. A população nesse grupo etário que se encontra fora da escola irá, em pouco tempo, engrossar a parcela da população ativa excluída dos setores modernos da economia.
O drama educacional do país revela-se por inteiro nos índices de defasagem escolar. Cerca de 14% das crianças de 7 anos encontram-se ainda na pré-escola. No Nordeste, essa proporção ultrapassa 30%. No conjunto do país, aos 18 anos, 90% dos jovens estão defasados, ou seja, em séries correspondentes a faixas etárias anteriores. Em média, crianças de 14 anos, que deveriam estar concluindo a 8ª série, chegaram apenas a cursar a 5ª série. Aos 18 anos, em média, os jovens que continuam na escola estão concluindo a 7ª série. Mas, nessa idade, boa parte deles já abandonou os estudos.
Boletim Mundo Ano 4 n° 6
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