Atualmente, cerca de 60% dos habitantes do planeta têm disponibilidade insuficiente de água, enquanto que quase 8% da população mundial já vive afetada por grave escassez. O cenário futuro não é otimista: estima-se que em 2050, cerca de 4 bilhões de seres humanos viverão sob escassez crônica do chamado “ouro azul”.
O espectro da escassez de água preocupa, em diferentes graus, quase todos os países. Mas China e Índia são casos especiais, pois abrigam cerca de um terço da humanidade. A população indiana cresce num ritmo bem mais acelerado e deverá ultrapassar a chinesa nas próximas décadas. Em ambos os países a população rural é mais numerosa que a urbana: cerca de 60% dos chineses e um pouco menos de 70% dos indianos vivem no meio rural.A agricultura é o setor econômico que mais utiliza recursos hídricos. Cerca de 70% da água utilizada é destinada a esse setor. O restante vai para uso industrial (20%) e doméstico (10%). Se a China exibe participação setorial não muito distante da média mundial (67%, 26% e 8% respectivamente), na Índia o setor agrícola apresenta consumo bem superior (mais de 80%).
Em termos de utilização de águas subterrâneas, o consumo per capita na Índia é cinco vezes maior que o verificado na China. Outra diferença encontra-se na situação dos recursos hídricos superficiais.
A dependência de água renovável vinda de fora do país na Índia é de 34%, enquanto na China é de apenas 1%. Isso se deve ao fato de que os principais rios chineses – o Yang-Tsé- Kiang, o Huang-Ho e o Sikiang terem a totalidade de suas bacias hidrográficas no interior da China, ao contrário do que ocorre com as bacias do Ganges e, especialmente, do Indo, que se estendem apenas parcialmente em território da Índia.
Entre suas nascente, no Tibete chinês, e a foz, no Paquistão, país onde localiza-se a maior parte de seu curso, o Indo atravessa um pequeno trecho da Caxemira indiana.
Todavia, alguns dos principais afluentes da margem esquerda do Indo têm parte considerável de seus cursos em território indiano. Nessa região, o maior perímetro irrigado do mundo, os dois países colaboram na utilização conjunta das águas fluviais, o que contrasta com a tensão geopolítica e militar que contamina a maior parte do seu relacionamento.
Já o Ganges, rio sagrado para o hinduísmo, corre quase integralmente no território da Índia. O país só não tem soberania em sua foz, um grande delta que ocupa parte considerável do território de Bangladesh. O programa de controle das águas num vale sujeito a desastrosas inundações requer maior colaboração entre os dois Estados. Contudo, antigas desavenças sobre a barragem indiana de Farakka e a partilha das águas bloqueiam a cooperação.
Bangladesh, um Estado muito pobre e pouco preparado para enfrentar desastres naturais, é especialmente vulnerável às inundações no amplo delta.
A China também enfrenta desafios hídricos significativos. Na porção centro-ocidental do país, área de domínio de climas áridos e semi-áridos e de população rarefeita, a questão da escassez é natural.
Na parte oriental, onde se concentra a maior parte da população e as principais regiões urbano-industriais, há diferentes dificuldades regionais.
A região meridional concentra cerca de três quartos dos recursos hídricos do com destaque para a bacia do Yang Tsé-Kiang. Ao norte, na bacia do Huang-Ho, onde os climas são mais secos, a escassez de água já é uma realidade.
Nessa área, responsável pela geração de mais de 60% das riquezas agrícolas, a irrigação intensiva já tem conseqüências dramáticas. Em 1972, pela primeira vez na milenar história do país, o rio Huang-Ho secou e deixou de chegar ao mar por 15 dias. Em 1997, ele deixou de correr para o mar por 226 dias.
É por isso que o governo chinês desenvolve o maior projeto de transposição de águas do mundo, que se destina a captar águas do sul e transferi-las para o norte. O projeto grandioso envolve a construção de três canais sul-norte, interligando quatro dos maiores rios do país, com conclusão prevista para 2050.
Nem tudo são rosas. Especialistas estimam que pelo menos 250 mil pessoas deverão ser reassentadas e chamam a atenção para o fato de que o projeto atende a uma pequena parcela do déficit de água da região. É um alerta importante para projetos semelhantes em outras partes do mundo.
Boletim Mundo n° 4 Ano 14
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