sábado, 31 de dezembro de 2011

PETRÓLEO VERDE

Governo aposta em transformar o país em potência energética, investindo na produção de biodiesel. Mas o projeto ainda esbarra em dificuldades de logística.

Uma das peças apresentadas na Exposição Universal de 1900, em Paris, chamava a atenção pelo cheiro. Era um motor a diesel que funcionava com óleo de amendoim.
Chamava a atenção, mas não se transformou em produto industrializado, principalmente por conta do preço baixo do petróleo, que fazia adormecer nas gavetas os projetos mais ousados.
Mais de um século depois, os motores movidos a óleo de amendoim, soja e a quase qualquer outra matéria orgânica voltaram à moda. O custo alto do petróleo e de outras fontes de energia, assim como as pressões pela defesa do meio ambiente, vêm transformando o biodiesel em uma grande aposta para a substituição – ainda que parcial – de combustíveis fósseis.
No Brasil, o biodiesel é uma das grandes apostas do governo Lula na corrida pela auto suficiência energética.
Em princípio, a aposta tem lógica.
O Brasil conta com grandes áreas agricultáveis e uma combinação entre cultivo de oleaginosas  como a soja – e produção de álcool etanol, ambos usados na reação que permite produzir o biodiesel.
Mesmo assim, a produção brasileira de biodiesel ainda esbarra na escala pequena, que aumenta os custos, e também nas dificuldades de logística – incluindo a coleta da matéria orgânica produzida em milhões de propriedades rurais e a difícil operação de combinar os fluxos de óleos vegetais e de álcool.
Biodiesel é um combustível que pode ser produzido a partir de óleos vegetais, gorduras animais e até óleos que sobram de frituras. Isso permite, pelo menos em teoria, que um número muito grande de pequenos proprietários rurais possa participar, de alguma maneira, da cadeia produtiva do biodiesel. Hoje em dia, os óleos orgânicos são misturados ao diesel em proporções variadas, que recebem uma classificação especial. Um óleo B2, por exemplo, indica que há 2% de biodiesel para 98% de diesel fóssil e assim por diante.
Um amplo estudo realizado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA) revelou que um óleo B100, isto é, totalmente composto por biodiesel, permite reduzir em 48% as emissões de monóxido de carbono dos motores de veículos, quando comparado com o diesel convencional. Há, também, uma redução de 47% na emissão das partículas inaláveis e quase que a eliminação das emissões de enxofre, bastante prejudiciais à saúde.
E tudo isso com uma perda quase desprezível da potência dos motores.
Já os óleos B20, mais comuns no mercado, apresentam reduções de 12% tanto na emissão de monóxido de carbono como de partículas inaláveis.

Os Estados Unidos, de olho no óleo
O biodiesel é um dos temas favoritos do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, que não perde uma chance de se referir às vantagens da produção de energia limpa. Na verdade, ele retrata uma febre que se alastra na sociedade americana.
A elevação dos preços do petróleo é um fenômeno estrutural, que reflete a estagnação das reservas conhecidas e o rápido incremento do consumo na China e na Índia (veja a edição de maio de Mundo). Esse é o pano de fundo estratégico do crescente interesse dos Estados Unidos pelas fontes renováveis de energia e, em particular, pela biomassa.
Em 2005, Bill Gates, o fundador da Microsoft e ninguém menos do que o homem mais rico do mundo, anunciou que estava comprando parte de uma usina de etanol. Os dois fundadores do Google visitaram o Brasil no ano passado, dizendo estarem dispostos a aplicar parte de sua dinheirama no mercado do álcool. E, de acordo com as projeções do governo americano, até o final de 2007 os Estados Unidos superarão o Brasil como maior produtor mundial de álcool combustível. E olhe que os norte-americanos extraem álcool de milho, processo mais complexo e mais caro do que a produção a partir da cana de açúcar.
Em 2004, os Estados Unidos aprovaram importantes incentivos fiscais para a produção de biodiesel. O maior garoto propaganda dessa onda, ao lado do presidente Bush, é o veterano cantor country Willie Nelson, que montou uma fábrica de biodiesel e incentiva a multidão de pequenos e médios produtores rurais do país a aderir.
A Marinha americana decidiu adotar o biodiesel em grande parte de sua frota de veículos e transformou-se, assim, no maior consumidor mundial isolado do petróleo verde. O país já conta com 35 indústrias de biodiesel e 1.400 pontos de venda – em geral, postos de gasolina. Um deles está instalado no Pentágono, o comando da área de Defesa da superpotência.
E duas das maiores fábricas de tratores que operam no país – a Daimler Chrysler e a John Deere – anunciaram que a maior parte de seus modelos já estão totalmente adaptados a funcionar com biodiesel ou com a mistura diesel/biodiesel.
A produção americana de biodiesel era quase insignificante em 1999, experimentando depois disso um crescimento exponencial. A projeção é que, em 2010, a produção norte-americana de biodiesel bata em 7,6 bilhões de litros ao ano, o que representaria 8% da demanda doméstica por óleo diesel.

Boletim Mundo n° 4 Ano 14

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