sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

REFORMA UNIVERSITÁRIA: “PROJETO ESTÁ EM SINTONIA COM TENDÊNCIAS NEOLIBERAIS ”

Osvaldo Coggiola

Um terremoto parece estar abalando as universidades, nos mais diversos países. As reformas universitárias em andamento possuem em comum a flexibilização e precarização do trabalho universitário e a desqualificação dos diplomas. Elas são inspiradas pelo Banco Mundial e o FMI, que passaram a se ocupar do chamado “mercado do ensino superior”, o que significa transformá-lo numa mercadoria (em vez de um bem público). Quais são os principais problemas da universidade no Brasil?
1. O escasso investimento governamental no ensino público: o governo federal investe 0,5% do PIB na universidade pública (contra 2,1% do Chile);
2. O baixo percentual dos jovens entre 18 e 24 anos que frequentam universidades, situado hoje na casa dos 9-10%, bem abaixo da média latino-americana;
3. Presença dominante do setor privado no ensino superior, ao contrário da América Latina e do resto do mundo: hoje temos 3,5 milhões de alunos na graduação, dos quais 2,4 milhões no setor privado e menos de 1,1 milhão no setor público.
4. Qualidade muito baixa do setor privado: 83% das universidades privadas sequer cumprem as exigências da LDB em relação à titulação e regime de trabalho do corpo docente, e em relação à pesquisa.
5. Crescimento do setor privado baseado, crescentemente, em fundos públicos, de modo indireto, através de renúncia fiscal ou direto, via crédito educativo, ou Fies (programa de Financiamento do Ensino Superior).
6. Heterogeneidade e desigualdade do sistema público (federais, estaduais e municipais), cada vez mais distante de um padrão unitário de qualidade, conseqüência do investimento desigual.
7. “Privatização branca” crescente das universidades públicas, com fundações e contratos com o setor privado, tudo favorecido pelo discurso que encoraja a diversificação das fontes de financiamento.
8. Ausência de autonomia e democracia reais nas universidades públicas e de autonomia de gestão patrimonial, financeira e didático-científica, pela intervenção do governo na nomeação das suas autoridades e na fixação das suas políticas.
A Reforma Universitária proposta pelo governo agrava esses problemas. A expansão de vagas no sistema público dar-se-ia basicamente através da expansão do ensino a distância, desqualificado. Além disso, haveria aumento da carga didática dos docentes e aumento do número de estudantes por classe, provocando queda da qualidade.
A expansão docente incorporaria os “aposentados excelentes”, e os “recém doutores”, com uma bolsa específica, ou seja, seria criado o docente 100% precário. Trata-se de uma falsa expansão, generalizando diplomas de curso superior, de valor escasso no mercado de trabalho, tendo como contrapartida uma elitização maior do ensino “de excelência”.
Prevê-se o aumento do investimento nas universidades federais, que seria complementado com o sistema de fundações, de desastrosos resultados na USP. Seu objetivo, além de manter o arrocho do ensino superior público, seria criar a concorrência entre docentes, com a diferenciação salarial. E por trás de tudo perfila-se a abertura de um novo filão: a criação de fundos empresariais para o ensino superior ou mesmo de uma lei de incentivo fiscal para o setor. O ensino superior, que já é pretexto para a renúncia fiscal que beneficia os empresários do ensino, estenderia essa benesse agora para o conjunto da classe capitalista, que pagaria menos (ou nenhum) imposto.
O restante dos problemas enumerados acima nem são tocados, ou são tocados só de raspão. A política mais espetacular é o ProUni, “estatização” de 100 mil vagas nas universidades privadas, destinadas a alunos de baixa renda, negros, índios e ex-detentos. Em cinco anos, o governo quer estatizar 300 mil vagas. Há quem suponha que o Prouni não coloca mais dinheiro em tais instituições. Mas, no projeto do MEC, se propõe “assegurar um fluxo regular adicional de recursos para aquelas  instituições universitárias que aceitem aderir a um Pacto de Educação para o Desenvolvimento Inclusivo”.
O MEC faria editais com as metas e objetivos e pagaria às universidades vencedoras da concorrência pública um valor mensal por aluno ao longo do curso, e um adicional na conclusão. O “Pacto” incluiria instituições privadas, ao lado das públicas. Mas usar dinheiro público para colocar alunos em fábricas de diplomas não é dar acesso universal ao ensino superior. Quantas vagas poderiam ser criadas nas universidades públicas com o dinheiro que foi anistiado do crédito educativo (R$ 1,5 bilhão) e da renúncia fiscal das filantrópicas (R$ 700 milhões)?
Tudo somado dá R$ 2,2 bilhões. Lembre-se que o orçamento de todas as federais é R$ 5,5 bilhões.
O Censo Educacional revelou que, das 1,47 milhão de vagas nas universidades privadas, apenas 924 mil estão ocupadas. Há uma “crise de sobre produção” no ensino superior privado e o Estado entra em cena para lhe garantir um mercado cativo, que evite a sua falência. O argumento usado, o de que a universidade pública atende os 10% mais ricos da população, foi desmantelado pelos dados que mostram que a média dos alunos das universidades públicas é menos rica do que a média dos alunos das particulares.
Por trás da aparência, a Reforma Universitária do governo Lula faz parte de um projeto político e educacional único, posto em sintonia com as tendências neoliberais mundiais.

Boletim Mundo n°6 Ano  13

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