terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Guerras e Tensões dilaceram o vale do Indo

Nelson Bacic Olic
O Indo é, por excelência, o rio do Paquistão, embora seu curso não atravesse apenas territórios paquistaneses. Com pouco mais de 3.000 km de extensão, o rio nasce nos planaltos do Tibet (o “teto do mundo”), em território chinês, cruza o noroeste da Índia (região da Cachemira) e adentra o Paquistão, onde muda bruscamente de direção. Corta este país em praticamente duas partes, e deságua num grande delta junto ao Oceano Índico . Todas as regiões do alto vale do Indo apresentam ou apresentaram num passado recente tensões geopolíticas.
O Indo cruza as áreas ocidentais do Tibet, região autônoma da República Popular da China, que é conhecida com o nome de Xizang. O Tibet possui 1,2 milhões de km2 e 2 milhões de habitantes, sendo os chineses minoritários, apesar dos estímulos à colonização empreendidos por Pequim. O Tibet esteve sob domínio da China de 1720 até 1913, quando conseguiu sua independência. Em 1951, foi ocupado pelo Exército comunista e, desde então, se transformou num dos principais focos de tensão no interior da China. O chefe religioso e temporal dos tibetanos, o dalai lama, desde 1959 encontra-se refugiado na Índia, de onde dirige a resistência contra a opressão nacional.
Na Índia, o rio atravessa regiões convulsionadas. À margem direita, está a região de Aksai-Chin, área planáltica que faz parte dos contrafortes da cadeia do Himalaia. Desde a época do Império Colonial Britânico, as fronteiras entre Índia e China nunca foram claramente demarcadas. Em 1962, um breve conflito entre forças chinesas e indianas definiram fronteiras a favor da China e hoje não reconhecidas pela Índia.
Junto à margem esquerda do Indo, localiza-se a Cachemira, região que tem sido objeto de disputas entre a Índia e o Paquistão desde 1947. Habitada majoritariamente por muçulmanos, a Cachemira indiana tem sido palco, periodicamente, de explosões de revolta contra o governo central, causadas tanto por aqueles que pretendem juntar a região ao Paquistão, quanto pelos que almejam criar uma Cachemira autônoma.
O Indo se constitui no eixo vital da geografia do Paquistão, dividindo-o em duas áreas étnico-culturais: uma, localizada a leste -regiões do Sind e Punjab, habitadas por etnias também encontradas na Índia; a outra, a oeste, é etnicamente próxima ao mundo afegão, representada especialmente pelas etnias pata e baluque.
De forma geral, os climas do Paquistão são predominantementes  áridos e semi-áridos. Não fosse o Indo e seus afluentes, o país teria imensas dificuldades na produção de alimentos. Os sistemas de irrigação do Sind e do Punjab (região partilhada entre Índia e Paquistão, em 1947), transformaram esta última no “celeiro” do Paquistão. Este fato realçou o Punjab como a região mais dinâmica do país, gerando ressentimentos e rivalidades com as populações do Sind. Fora as rivalidades regionais, a heterogeneidade étnica implica diferenças de mentalidade e estruturas sociais.
Além disso, há as diferenças religiosas  entre sunitas (majoritários) e xiitas. Há ainda, no Sind, rivalidades entre os seus habitantes tradicionais e os mohajires, muçulmanos da Índia que migraram para lá em 1947.
Durante a invasão soviética do Afeganistão (1979-88), o Paquistão foi um ponto de apoio fundamental para os guerrilheiros contra as tropas soviéticas e o governo pró-Moscou. A retirada soviética não encerrou o conflito interno afegão, que vez por outra ameaça transbordar para o vizinho Paquistão. Certos setores das etnias baluque e pata (existentes também no Afeganistão) sonham com países independentes.
Ganges, rio sagrado dos hindus
O Ganges é o rio sagrado dos hindus. Ao longo de seu vale, encontram-se situados alguns lugares santos, como Benares e Ayodhya. Com nascentes no Himalaia do Nepal, o Ganges deságua cerca de 2.500 km depois, no golfo de Bengala. Algumas dezenas de quilômetros antes de sua foz, suas águas se juntam às do rio Bramaputra, formando um imenso delta. Grande parte desse delta corresponde ao território onde se localiza Bangladesh, um dos países mais pobres do mundo e vítima de inundações a cada nova monção de verão.
Problemas ao longo do vale do Ganges não faltam. Em seu alto vale, eles são de caráter ambiental: a derrubada indiscriminada de matas no Nepal tem agravado o assoreamento, tanto na porção do rio que corre na Índia como na parte que drena áreas de Bangladesh.
O médio vale do rio sempre se caracterizou como o principal eixo de penetração da Índia setentrional. O vale do Ganges facilitou, por exemplo, a penetração de muçulmanos e a dos colonialistas britânicos.
Na porção indiana do vale vive metade da população do país. Estão aí localizados três dos quatro Estados mais populosos, e também mais da metade dos 100 milhões de muçulmanos que habitam a Índia. O baixo vale do rio drena parcelas consideráveis de Bangladesh, o terceiro país do mundo em número de muçulmanos.
As diversidades encontradas ao longo do vale são inúmeras, especialmente em território da Índia. É um mundo tradicionalmente rural, mas que  possui em contrapartida enormes cidades. Aí coexistem e se justapõem locais sagrados de hindus e muçulmanos. Periodicamente, ocorrem lutas entre as duas comunidades como aconteceu em 1992, em Ayodhya, onde uma mesquita foi destruída por fundamentalistas hindus, sob a alegação que ela havia sido construída sobre o local de nascimento do deus Brahma. Em seguida, uma  série de atentados se verificaram em algumas grandes cidades da Índia e foram atribuídos aos muçulmanos.
Segundo algumas autoridades, esses atentados teriam sido monitorados do exterior, isto é, do Paquistão, república islâmica localizada na fronteira ocidental da Índia. Começava assim mais um episódio da rivalidade entre Índia e Paquistão, que se manifesta periodicamente desde 1947, data da independência dos dois países.
Boletim Mundo Ano 4 n° 2

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