terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Imagem e valor na era da Globalização

O império das marcas
Nelson Blecher
Quando você bebe uma Coca-Cola, compra uma malha da Benetton ou liga o aparelho para assistir à MTV, você não apenas escolheu um refrigerante, uma roupa e uma emissora de TV, mas se associou a uma comunidade global. Em dezenas de países, jovens da sua idade, igualmente influenciados pela mídia, fizeram opções semelhantes naquele mesmo dia. A possibilidade, gerada pelas novas tecnologias de telecomunicações, de espalhar marcas de produtos e serviços por um enorme número de países, ampliou de forma jamais vista o valor dos logotipos. A isso se chama ganhos de escala: é incomparavelmente maior o lucro de empresas com capacidade de vender suas mercadorias em muitos países do que as que estão limitadas a um só mercado.
Estamos ingressando em uma era já batizada de economia simbólica, em que o valor de um produto não é mais medido pelos custos de matéria-prima ou dos funcionários envolvidos na produção. O patrimônio mais valorizado, agora, é a capacidade de criação e de reprodução dos bens em escala global. Um programa de computador desenvolvido pela Microsoft de Bill Gates pode alavancar infinitas vezes mais lucros com custos bem inferiores aos dos automóveis da linha de montagem de Henry Ford, pioneiro da indústria automobilística.
“A marca passou a valer mais do que a tecnologia em si mesma, pois  tornou-se uma garantia de qualidade ou um ‘padrão’’’, afirma o economista Gilson Schwartz. “Quem consegue criar novos padrões, novas marcas, pode criar novos mercados ou conquistar os já existentes.”
Eis um exemplo: para incorporar aos seus domínios a indústria de alimentos Kraft, na década de 80, a americana Philip Morris pagou dez vezes mais pelos logotipos estampados em seus queijos e sorvetes do que pelos prédios e equipamentos da companhia.
É por tudo isso que as empresas gastam fortunas em publicidade. Para que suas marcas sejam cada vez mais familiares aos consumidores. As marcas que não se comunicam tendem a desaparecer,  perder força ou cair no esquecimento. Segundo a revista americana Fortune, os executivos da  Coca-Cola costumam brincar que se de uma hora para outra todas as fábricas do refrigerante instaladas em mais de cem países desaparecessem, bastaria obter um empréstimo de US$ 100 bilhões junto aos bancos para rapidamente reconstruí-las. Tal é a força da marca mais valiosa do mundo, cujo valor é estimado em US$ 39 bilhões pela Financial World. Na lista anual dessa publicação, a segunda marca mais valorizada é a do cigarro Marlboro (US$ 38,7 bilhões). Outro estudo, da Young & Rubicam, revelou que em uma constelação de 8.500 marcas, Coca-Cola é a que brilha mais forte.
Não por acaso, empresas de informática ocupam lugar de destaque. São vinculadas a esse setor de crescimento explosivo seis das dez marcas que escalaram posições em 1995. Isso reflete o poderio e o dinamismo do setor, traduzido por sucessivos lançamentos de novos produtos.
Foi no período pesquisado pela revista que a Intel lançou o chip (unidade de memória) Pentium. A Microsoft, estimada em US$ 11,7 bilhões, não apenas passou a valer 31 mais que em 1994, como foi apontada como a marca mais bem administrada.
A construção de uma marca forte exige anos de investimentos. Ainda assim há o risco de seguir para a coluna dos perdedores. Um levantamento da Copernicus, uma consultoria de marketing de Massachusets, aponta que menos de 10% dos novos produtos são bem-sucedidos o suficiente para permanecer no mercado americano nos dois anos seguintes ao do lançamento. No Brasil, o risco é menor, já que o número de produtos em exposição nas gôndolas é inferior aos 20 mil lançados nos EUA a cada ano. Dos 570 produtos que surgiram por aqui em 1989, 24% não estão mais à venda.
Veja só: são necessários cerca de US$ 100 milhões para se lançar uma nova marca de refrigerante nos Estados Unidos.
Em outras indústrias, a taxa de fracasso pode ser ainda maior: apenas 1% dos novos produtos introduzidos nas cadeias de fast-food são bem-sucedidos.Em certos casos, nem a providência de consultar previamente os consumidores pode dar garantia.
O McDonald’s não decolou as vendas do McLean (hambúrguer diet) mesmo tendo detectado a preferência por produtos mais saudáveis. O caso mais antológico de fracasso foi o da New Coke, que havia sido submetida ao crivo de 190 mil consumidores.
Participar da economia global será um fator diferenciador para as empresas na virada do milênio. Veja o caso da Benetton, uma potência no ramo do vestuário. Seu faturamento atinge US$ 2 bilhões anuais.
É um negócio sustentado por 7 mil lojas, a maioria sob licenciamento, estabelecidas em quase cem países. Suas 14 fábricas espalham-se pela Itália, França, Espanha, Estados Unidos e Brasil. Para produzir acima de 80 milhões de peças anuais, processa 100 milhões de quilômetros de fios  metragem equivalente a mais de 2.500 voltas em torno do planeta. É também a maior consumidora mundial de lã.
O sucesso da Benetton deve-se à prática, pioneira no setor, de combinar produção em escala elevada com a volatilidade no mercado da moda. Sua operação é facilitada pelo emprego farto de tecnologia. As encomendas chegam às fábricas através da rede de computadores. Só então as peças semi prontas, confeccionadas em teares automatizados, são tingidas com as cores da moda.  Daí o slogan “United Colors of Benetton”. A publicidade heterodoxa da Benetton, apoiada por verba de US$ 80 milhões anuais, vem causando polêmica há uma década, desde que o anúncio “Todas as cores do mundo”, que estampava a foto de um grupo de jovens loiros e negros, fora recusado por revistas sul-africanas. O grupo ganhou uma ação movida contra a Agência Francesa de Luta Contra a Aids, que reivindicava indenização por causa de anúncios em que a expressão HIV Positivo aparecia gravada na nádega do modelo. A Benetton é a indústria que mais aposta em imagens (quase nunca relacionadas aos produtos) para fixar sua marca associada a questões sociais.
Algumas companhias brasileiras já estão se aventurando a romper as fronteiras nacionais para garantir um espaço ao sol. É este o caso da Cervejaria Brahma, que depois de fincar sua bandeira na Venezuela e na Argentina, avança para outros países latino-americanos. A Sadia vende suas carnes industrializadas em remotos países do Oriente Médio, como o Kuwait e Emirados Árabes. Talvez você não saiba, mas uma das marcas de café mais vendidas na Rússia traz o aval da Cacique, uma empresa paulista.
Boletim Mundo Ano 4 n° 2

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