terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Na Índia, tensão étnica e religiosa ameaça o Estado

Em maio de 1996, a Índia realizará eleições gerais, fato que periodicamente vem se repetindo desde 1947, data em que o país conquistou sua independência da Grã-Bretanha. Os destinos políticos da Índia têm relevância mundial: com cerca de 880 milhões de habitantes e previsões de chegar a 1 bilhão no ano 2000 e 1,5 bilhão em 2040, a Índia deverá se tornar o país mais populoso do mundo, superando a China. De certa forma, os problemas hoje enfrentados pela Índia constituem uma bomba de efeito retardado para o resto do mundo.
A população da Índia constitui um verdadeiro mosaico étnico, religioso e lingüístico. Habitam o país povos de origem ariana de pele clara na parte norte, povos dravidianos de pele escura no sul e populações de característica mongol e centro-asiática em regiões do Himalaia e do leste.
Quanto ao aspecto religioso, a comunidade mais expressiva é a hindu, que compreende 82% da população e coexiste  com uma das maiores comunidades muçulmanas do mundo, com mais de 100 milhões de pessoas. Além disso, há importantes  minorias cristãs, sikhs e budistas.
Apesar da grande maioria hindu, o governo central tem permanentemente reafirmado o caráter laico do Estado. Isso pode ser atribuído ao fato de o hinduísmo, cuja filosofia se assenta sobre um sistema aberto à pluralidade, ter sido a base da consciência nacional. Essa maneira plural de ver o mundo contribuiu para manter a unidade do país, apesar de todas as diversidades.
A variedade lingüística é enorme.
Cerca de mil e seiscentas línguas e dialetos convivem no país, com importância numérica muito desigual. O hindi, falado por 40% da população é apenas uma das 14 línguas consideradas oficiais, sem contar o inglês, usado pelas elites.
Típico país do chamado Terceiro Mundo, apresenta grandes desigualdades sociais, mas o que chama a atenção é a sobrevivência do seu sistema de castas, sem paralelo no mundo. As castas correspondem a classes de pessoas que tendem a permanecer separadas das outras por seus privilégios, preconceitos e costumes. Calcula-se que existam no país cerca de 3 mil castas e 25 mil sub castas. Ainda que sua importância tenha diminuído nos meios urbanos, esse sistema exerce ainda grande influência no tecido social da Índia rural, que concentra 70% da população do país. A Constituição em vigor não reconhece valor algum no sistema de castas.
A União Indiana, um Estado federal e parlamentarista, nasceu com o fim do domínio colonial britânico sobre o Indostão. O desmantelamento do Império Britânico das Índias resultou na partilha da antiga colônia em dois países, segundo critérios religiosos: a Índia, de maioria hinduísta, e o Paquistão, muçulmano. Este, por sua vez, ficou geograficamente dividido em duas partes, o Paquistão Ocidental e o Oriental que, em 1971, tornou-se independente, com o nome de Bangladesh.
Desde 1947, a Índia vem se defrontando com dois tipos de ameaças à sua integridade territorial. Uma delas é externa, já que dois de seus vizinhos, a China e o Paquistão, reivindicam parcelas do território hindu. A outra é interna e diz respeito a tensões causadas pela grande heterogeneidade da população do país.
As reivindicações da China referem-se a trechos de fronteiras junto ao Himalaia, tanto a noroeste como a nordeste.
Conflitos de fronteiras entre os dois gigantes demográficos eclodiram em 1959, 1960 e 1962. Com o irmão-inimigo Paquistão, os problemas dizem respeito à Cachemira. Esta região, onde os muçulmanos perfazem 75% da população, ficou sob controle da Índia depois de enfrentamentos militares em 1947-49 e 1965.
As tensões internas têm se manifestado tanto no sentido separatista quanto no da obtenção de maior autonomia em relação ao governo central. Merecem destaques os conflitos no interior da Cachemira e no Punjab, onde predominam as populações sikh. Há também contestações menos importantes que eclodem periodicamente no leste do país. Como se tudo isso não bastasse, as tensões religiosas entre fundamentalistas hindus e muçulmanos geraram distúrbios em 1992-93, deflagrados pelos graves episódios em Ayodhya .
A Índia talvez seja mais um Estado-civilização que um Estado- nação. A pluralidade de etnias e religiões no espaço geográfico indiano sobrevive em equilíbrio instável. O Estado conserva uma precária legitimidade, assentada sobre o jogo democrático.
Contudo, a soma das crescentes tensões externas e internas com o aumento da influência do fundamentalismo hinduísta podem colocar em risco a frágil democracia indiana.
Fundamentalismo hindu lidera oposição
O Partido do Congresso, originado do Congresso Nacional Indiano, movimento pela independência criado por Mahatma Gandhi, governa a Índia desde 1947, com raras e fugazes interrupções. A antiga primeira-ministra Indira Gandhi (1966-77) consolidou-o como partido da ordem, que agrupa a elite política e as burocracias administrativas regionais em um sem-número de facções rivais internas.
O BJP (Bharatiya Janata Party), partido nacionalista e hinduísta, é o grupo oposicionista mais poderoso. Seu crescimento surpreendente, que lhe permitiu controlar governos regionais do Vale do Ganges, deve-se ao desgaste provocado pela corrupção no governo e à sua mensagem fundamentalista, dirigida contra a minoria muçulmana.
Boletim Mundo Ano 4 n° 2

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