Ingresso do país no Nafta (mercado comum com Estado Unidos e Canadá), em 1º de janeiro de 1994, foi “batizado” por uma revolta de índios miseráveis sufocada de sangue por tropas do governo.
O dia primeiro de janeiro de 1994 tinha um valor especial para o México.
Nesta data, o governo mexicano comemorava a entrada em vigor do Nafta, o Mercado Comum da América do Norte, junto com os Estados Unidos e o Canadá. Para muitos, essa era a senha do México para ingressar no Primeiro Mundo.
Neste mesmo dia, o país se defrontou com um fato que o fez redescobrir uma dura realidade que andava esquecido. Um grupo de guerrilheiros do até então desconhecido Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) intempestivamente ocupou sete localidades do Estado de Chiapas.
Localizado na porção sul do país, junto à fronteira com a Guatemala, de quem fez parte até 1842 , o Estado de Chiapas reproduz, a grosso modo, todos os esquemas de injustiças que ocorrem em países latino-americanos com importantes contingentes indígenas em suas populações.
A causa principal da revolta é uma mistura de ingredientes explosivos:
Conjunção de particularismos locais agravados pelas orientações recentes da política nacional mexicana. Chiapas, além de ser o Estado mais pobre do país, é também aquele que apresenta uma grande concentração de indígenas de várias origens. Eles vivem basicamente da agricultura, confinados nas regiões mais altas e acidentadas, fruto da expropriação de terras da qual têm sido vítimas desde o período colonial. Não há dúvidas de que a exploração das riquezas da região tem como base a servidão secular dos índios. Mesmo durante a Revolução Mexicana (1910-17, Chiapas ficou à margem dos acontecimentos, e apenas durante o governo de Lázaro Cárdenas (1934-40), foram tentadas reformas polítco-sociais mais consistentes, ainda que tímidas, na região. Os governos posteriores ao de Cárdenas voltaram a favorecer os grandes proprietários rurais e deixaram sem solução os anseios mais antigos das comunidades locais.
Nos últimos 5 anos, o México passou por importantes transformações econômicas, especialmente após a eleição de Carlos Salinas de Gortari (1988). A partir de então, o governo passou a colocar em prática os chamados ajustes estruturais da economia, conforme figurinos ditados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
Esses ajustes eram baseados em três grandes vertentes: a privatização das empresas estatais, o enxugamento da máquina administrativa do Estado e a abertura para o mercado externo com a redução e estímulos à exportação. Os aparentes acertos econômicos levaram o México a ser considerado um modelo para outros países: era o “tigre” latino americano. O corolário disso foi sua indicação para integrar o Nafta.
Mas o progresso econômico não atingiu todas as áreas do país. Ao contrário, acentuou a divisão entre um México mais rico (o norte) e um mais pobre (o sul). Em Chiapas, o progresso chegou tarde e mal, acentuando as diferenças já existentes. As primeiras declarações dadas pelos líderes da rebelião afirmava expressamente seu repúdio ao Nafta.
A revolta colocou em xeque o tradicional domínio do Partido Revolucionário Institucional (PRI). Ele tem se mantido no poder há 65 anos às custas de expedientes no mínimo fraudulentos, a ponto de alguns se referirem à democracia mexicana como “ditadura perfeita”. Dias após a eclosão da revolta, o governo retomou o controle da situação. Isso foi conseguido às custas de violenta repressão, que incluiu bombardeios sobre populações civis e violações dos direitos humanos. Apesar da aparente vitória governamental, a imagem do país saiu bastante arranhada do episódio.
A REVOLUÇÃO INACABADA DE VILLA E ZAPATA
O grupo que liderou a revolta de Chiapas tinha o nome de Exército Zapatista de Libertação Nacional, em homenagem ao líder camponês e revolucionário mexicano Emiliano Zapata (1879-17). Durante a Revolução Mexicana (1910-17), Zapata liderou um exército de índios e camponeses do sul do México que, com sua luta, contribuiu para a derrubada do ditador Porfírio Diaz. Com Pancho Villa (líder de camponeses do norte), Zapata pretendia uma reforma agrária que expropiasse as terras dos proprietários beneficiados pela longa ditadura de Diaz.
Muitos historiadores consideram a Revolução Mexicana como um dos mais importantes eventos políticos registrado ao longo da conturbada história da América Latina. Contudo, em seu desenrolar, a revolução tomou rumos cujos resultados e nem sempre coincidiram com as propostas de seus líderes. A revolução foi uma obra inacabada. Esgotou-se sem atingir seus objetivos de justiça social, que se dissolveram nas décadas seguintes. Os rebeldes que fizeram sua aparição no primeiro dia do ano em Chiapas exigiam “Terra e Liberdade”. Não por coincidência, era o lema de Zapata...
SERVIÇO:
Livros sobre o México e a Revolução Mexicana:
• A Revolução Mexicana (1910/17), Anna Maria M. Corrêa, Brasiliense, SP, 1983
• A Revolução Mexicana, Héctor Alimonda, Moderna, SP, 1986
• América Latina: Dependência e Integração, Ruy Marini, Brasil Urgente, SP, 92
• México Rebelde, John Reed, Civilização Brasileira, Rio, 1978
Filmes disponíveis em vídeo:
• Vera Cruz, 1954, Estados Unidos, Robert Aldrich
• Quandoi Explode a Vingança, 1972, Itália, Sergio Leone
• Meu Ódio Será Sua Herança, 1969, Estados Unidos, Sam Peckinpah
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